Eu fiquei imóvel por um instante, mas respondi:— Estou bem, não estou com sono.No entanto, no segundo seguinte, não consegui segurar um bocejo.Jean deu uma leve risada:— Durma um pouco. Vamos levar uma hora até chegar à sua empresa.Eu pensei que, se não dormisse, o silêncio no carro ficaria ainda mais desconfortável. Por outro lado, se tentássemos conversar, poderia surgir um assunto delicado, o que tornaria tudo ainda mais constrangedor.Dormir parecia a opção mais sensata. Mesmo que eu não conseguisse, poderia ao menos fingir.— Certo, acho que posso tentar descansar um pouco.Minha intenção inicial era apenas fechar os olhos e fingir que estava dormindo, enquanto pensava nos croquis que precisava preparar ou em como organizar o desfile de moda em Milão após o Ano Novo. Mas, antes que eu percebesse, Jean apertou um botão, e o encosto do meu assento se ajustou automaticamente a uma posição ergonômica perfeita, me deixando praticamente deitada, confortável como nunca.Instintivame
Jean manteve o olhar calmo, os traços serenos, enquanto me encarava por alguns segundos antes de falar em um tom tranquilo:— Kiara, eu posso esperar. Um ano, dois, três ou até cinco. Eu posso esperar.Minha mente simplesmente explodiu! Fiquei paralisada, como se o mundo ao meu redor tivesse parado, enquanto uma leve tontura tomava conta de mim. Ele realmente disse isso, assim, de forma tão direta, sem aviso, sem rodeios?Eu não fazia ideia de qual expressão estava no meu rosto naquele momento, mas meu coração estava disparado como nunca antes. Como eu deveria responder? Recusar novamente? Ou dizer “então espere”?— Sr. Jean, eu…— Eu já te pedi para não me chamar de Sr. Jean.Minha cabeça, que já estava uma bagunça, ficou ainda mais confusa com a interrupção dele. Não consegui dizer mais nada.Jean abriu a porta do carro e saiu, caminhando calmamente até a frente do veículo e, em seguida, vindo para o meu lado. Eu, ainda atordoada, virei para encará-lo, com os olhos arregalados como o
Mas aquele “tum” alto não assustou apenas as pessoas que esperavam o elevador do lado de dentro, como também pegou Jean de surpresa.— Kiara! — Ele gritou de repente, alarmado.Eu, no entanto, estava tão envergonhada que não tive coragem de responder, muito menos de parar.O elevador chegou naquele exato momento. Os funcionários que aguardavam começaram a entrar, e eu, sem diminuir o passo, gritei um “esperem” enquanto corria para dentro, ainda com a mão na testa. As portas se fecharam, e o elevador começou a subir.Soltei um longo suspiro de alívio, mas meu coração continuava disparado, e minha cabeça parecia um turbilhão. Eu sequer queria imaginar qual teria sido a reação de Jean. Ele, com certeza, devia estar pensando o quanto eu era desajeitada e, pior ainda, que eu estava tão apaixonada por ele que fiquei completamente sem rumo depois da declaração.Quando cheguei ao andar da empresa e entrei, percebi algo inesperado ao passar pela sala do gerente geral. Havia alguém lá dentro. Ol
— Srta. Kiara, o que você prefere beber? Café, café ou talvez um suco de frutas? — Lucas colocou os documentos sobre a mesa e, ao se virar para o balcão, lançou a pergunta com um sorriso leve.— Café, por favor.— Certo.Enquanto ele se ocupava no balcão, aproveitei para massagear minha testa. Sentia que um pequeno galo estava começando a se formar. Suspirei, frustrada, e puxei a franja para cobrir o local.Lucas voltou com duas xícaras de café e as colocou na mesa:— Este café é feito com grãos que um amigo meu da Austrália enviou. Experimente e me diga o que achou.— Obrigada.Peguei a xícara e tomei um gole. Ainda estava tentando identificar o sabor quando ele, de repente, perguntou:— Srta. Kiara, o que aconteceu com sua testa? Parece que está inchada.Imediatamente, fiquei sem graça. Engoli o café rapidamente e mexi no cabelo para disfarçar:— Ah… Não foi nada. Só bati sem querer.— Você deveria aplicar gelo para evitar que inche.Antes mesmo de terminar a frase, ele já tinha se l
Preocupar-se genuinamente com alguém significa estar atento a todos os detalhes da vida dessa pessoa, até mesmo às suas pequenas dores e incômodos. Afinal, nesta vida, quantas grandes doenças ou provações realmente enfrentamos?O verdadeiro cuidado e afeto não estão nas grandes declarações ou gestos grandiosos, mas sim nas pequenas atitudes do dia a dia, nos detalhes aparentemente banais.Pensando nisso, me arrependi ainda mais pelas palavras que disse a Jean. Senti que tinha sido ingrata e decidi que, mais tarde, precisaria pedir desculpas a ele.— Srta. Kiara? Srta. Kiara?Lucas chamou meu nome algumas vezes antes de eu sair do meu devaneio. Pisquei rapidamente, voltando à realidade, e respondi apressada:— Ah? O que você disse?Ele me olhou com uma expressão ligeiramente intrigada.— Está tudo bem? Se hoje não for um bom momento, podemos deixar essa conversa para segunda-feira.— Não, está tudo bem. Hoje eu tenho tempo. — Respirei fundo, tentando me recompor, e me ajeitei na cadeira
O jantar já estava quase terminando quando alguém passou ao meu lado e, de repente, me cumprimentou:— Srta. Kiara, que coincidência!Ao ouvir minha menção, levantei a cabeça e, ao vê-lo, fiquei surpresa por um instante. Mas logo reconheci quem era: Pablo, amigo de Jean e o herdeiro da família Braga.Que encontro inusitado.— Boa noite, Sr. Pablo. — Levantei-me e o cumprimentei educadamente.Pablo assentiu com um leve sorriso:— Boa noite.Em seguida, ele desviou o olhar em direção à pessoa sentada à minha frente. Foi então que percebi a situação e, rapidamente, fiz as apresentações:— Este é Lucas, o novo gerente geral da minha empresa. Sr. Lucas, este é Pablo, herdeiro do Grupo Braga e uma figura de destaque em Saurimo. Quem sabe vocês possam colaborar no futuro.Antes mesmo que eu terminasse a frase, Lucas se levantou, estendendo a mão com respeito:— É um prazer conhecê-lo, Sr. Pablo.— O prazer é meu, Sr. Lucas.Depois de um breve aperto de mãos, os olhos de Pablo voltaram para mi
— Alô, Kiara... A voz baixa e suave de Jean soou do outro lado da linha, com um tom tão acolhedor que parecia aquelas locuções claras e tranquilas da época de escola, capazes de aquecer o coração e afastar qualquer frio.Eu segurava o celular, mas minha mente deu um branco completo. Quando tentei falar, as palavras simplesmente travaram, e tudo o que consegui dizer foi:— Então... você já comeu?Do outro lado, ouvi um riso contido:— Já comi. E você?— Eu? — A pergunta dele me pegou de surpresa e, de repente, minha mente voltou ao normal. — Você não sabe se eu comi ou não?— Como assim? Eu deveria saber? — Jean perguntou, visivelmente confuso.Eu fiquei paralisada por um momento até perceber a verdade: O Pablo não tinha ligado para ele! Meu plano mental estava todo errado.Coloquei a mão na testa, suspirei e soltei um gemido de frustração:— Eu pensei demais... Fui vítima de uma armadilha do Mestre Pablo.— Que armadilha? — Jean parecia ainda mais perdido. — O que o Pablo tem a ver co
Compatibilidade de ideias.Aquela frase soava estranha, como se ele estivesse com ciúmes. Percebi que havia algo diferente no tom, mas, por sorte, estávamos conversando pelo celular, o que me permitia esconder minha expressão.Depois de alguns segundos de silêncio desconfortável, eu pigarreei e tentei mudar de assunto:— Então… já está tarde. Eu preciso dirigir de volta para casa. Não esqueça de agradecer ao Mestre Pablo por mim.Assim que terminei de falar, me preparei para encerrar a chamada. No entanto, Jean me interrompeu:— Kiara.Meu corpo ficou tenso, e levei o celular de volta ao ouvido:— Sim?— Você acabou de elogiar outro homem na minha frente. Eu fico com ciúmes, sabia? Não se esqueça de que fui eu quem deixou claro os meus sentimentos primeiro. Quero que você seja justa, imparcial... e equilibrada. Caso contrário…A voz baixa e envolvente de Jean, com aquele tom calmo e hipnotizante, parecia ter um poder quase mágico. Ela invadia meus ouvidos e seguia direto para o coração
No segundo seguinte, porém, o olhar da Sra. Serra se voltou para mim. Com uma expressão nada amigável, ela disse:— Essa Srta. Kiara é amiga do Mestre Jean? Uma garota dessas, de família tão insignificante e sem muita educação, está a anos-luz da família Auth. Mestre Auth sempre foi conhecido por…— Sra. Serra, Kiara é minha namorada. E, como ela não tem nenhum vínculo com a senhora, não cabe a você dar lições a ela. — Jean interrompeu, mantendo o tom calmo, mas com firmeza suficiente para cortar as palavras dela.Levantei as sobrancelhas, surpresa. Nunca imaginei que ele seria tão direto, chegando a interromper uma pessoa mais velha.O rosto da Sra. Serra ficou imediatamente sombrio.— Jean, minha mãe só está tentando ajudar. Você viu o quão arrogante Kiara é? Ela chutou minha perna e me deixou com um hematoma! — Emilia tentou defender a mãe, levantando a saia para mostrar o machucado na perna.Eu estava prestes a explicar, mas Jean foi mais rápido:— Kiara não machucaria alguém sem m
Eu ainda estava na concessionária quando o celular tocou. Era Tatiana.— Kiara, a Sra. Isabela está aqui procurando por você.Respondi, sem me abalar:— Não se preocupe com ela. Diga que eu tenho compromissos hoje, não vou voltar para a empresa, e peça para ela ir embora.— Mas ela se recusa a sair. Está sentada no seu escritório. Posso pedir para os seguranças tirarem ela de lá?— Não precisa, deixe ela sentada lá.Sabia que, se Isabela causasse confusão, até os seguranças poderiam não dar conta da situação, e isso acabaria prejudicando a operação normal da empresa.— Tudo bem... — Tatiana suspirou e desligou.Não dei muita importância ao assunto. Isabela só sabia aparecer para pedir dinheiro, nada mais. E eu estava decidida: não daria um centavo. Se cedesse uma vez, seria um ciclo sem fim.Guardei o celular no bolso e me virei para voltar ao salão de exibição. Mas, ao levantar o olhar, dei de cara com uma figura familiar. Não, mais do que familiar: uma inimiga.Emilia vinha andando,
— Não precisa se apressar com a transferência da casa. Vamos falar sobre a situação da Tânia. Você disse no tribunal que, se ela te pedisse desculpas, aceitaria um acordo extrajudicial. Isso ainda vale? — Davi perguntou, direto.Eu franzi as sobrancelhas e o encarei:— Você está nesse estado, saindo no frio dessa noite, só para perguntar isso?— E por que não? Você bloqueou meu número e, mesmo depois de trocar o seu, continua ignorando minhas ligações. — Ele rebateu, com um tom de leve acusação e sarcasmo. — Parece até que atender minhas chamadas é uma sentença de morte para você.Fiquei surpresa. Agora que ele mencionou, lembrei que, de fato, tinha recebido duas ligações de números desconhecidos durante o dia e as rejeitei automaticamente.— Ainda vale? — Ele repetiu a pergunta, insistente.Eu respirei fundo. Para ser sincera, não queria que valesse. A atitude de Tânia no tribunal tinha me irritado profundamente.Mas, com Carlos prestes a sair da prisão e sem saber que tipo de problem
Eu fiquei sem palavras. Ainda bem que ele não fez isso, porque, se tivesse feito, eu nunca mais teria cara para encarar Lucas na empresa. A menos que eu trocasse de gerente imediatamente.Pensando nisso, murmurei arrependida:— Se eu soubesse, nem teria te contado. Você não ia me encontrar por acaso, e nem sequer saberia...— O que você disse?— Eu disse que finalmente descobri um defeito seu: ciumento e infantil! — Virei-me para ele, articulando cada palavra de propósito, só para provocá-lo.Mas, em vez de se irritar, ele riu e respondeu com naturalidade:— Tenho muitos defeitos. Com o tempo, você vai descobrindo todos.— Então, por que você não me conta logo? Assim, eu evito te irritar.— Prefiro não.Nossos comentários eram tão infantis que, no final, nem nós mesmos conseguimos levar a conversa a sério.— Chega disso. Vou te levar para casa. Amanhã de manhã, vamos direto ver o carro, e depois te deixo no trabalho. — Jean mudou de assunto, enquanto já organizava minha agenda do dia s
Mas era um sorriso de felicidade.— Tudo bem, se você insiste em vir, não tem como eu te impedir. — Respondi, resignada. Depois de desligar o telefone, voltei para a mesa. Lucas já tinha começado a comer. — Come logo, os ingredientes aqui são bem frescos, está uma delícia. — Assim que me sentei, ele colocou um taco com pimenta no meu prato. Eu rapidamente recusei: — Obrigada, mas pode comer você. Eu me sirvo sozinha. Ele apenas sorriu, como se não tivesse escutado o que eu disse, e continuou colocando comida no meu prato. Naquele momento, lembrei das palavras de Tatiana, que havia comentado que Lucas parecia ter interesse em mim. De repente, achei que a ideia de Jean vir me buscar fazia muito sentido. Pelo menos ficaria claro para Lucas que eu já tinha namorado e que ele não deveria investir mais energia nisso. Terminamos o jantar por volta das nove da noite. Eu estava pensando se Jean já teria terminado seus compromissos, quando o telefone tocou. Era ele, dizendo que já
— Só consegui fazer um reparo provisório. Amanhã você deve levar o carro na concessionária para trocarem a fiação. Assim, evita que o problema volte e te deixe na mão de novo. — Lucas explicou.Eu fiquei muito agradecida e agradeci várias vezes. Como as mãos dele estavam sujas, fui até o carro e peguei uma garrafa d’água para ajudá-lo a lavar as mãos.Depois que Lucas terminou de lavar e secar as mãos, ele olhou para mim e comentou:— Está frio hoje. Me fez lembrar da última vez que a Srta. Kiara me convidou para comer comida mexicana.O recado era claro. Ele queria repetir o convite. Não tive como ignorar e respondi com um sorriso:— Então, que tal eu convidar o Sr. Lucas para jantar comida mexicana hoje? Assim aproveito para agradecer a ajuda com o carro.Se não fosse por Lucas, eu provavelmente teria que esperar no frio por uma ou duas horas até o pessoal da concessionária chegar para fazer o reparo.Lucas riu, satisfeito:— Combinado. E não me ache cara de pau, viu, Srta. Kiara?Co
Eu sabia que minha tia era extremamente supersticiosa. Ela vivia consultando diferentes médiuns e curandeiros, então usei essa frase de propósito, só para assustá-la. Afinal, eu não acreditava nessa bobagem, e não tinha medo de que ela usasse isso contra mim. Como esperado, assim que falei, Camila ficou tão irritada que começou a gaguejar: — Kiara, você... você realmente é... — Ela respirou fundo antes de continuar. — Não é à toa que a Isabela diz que você não tem laços familiares e tem um coração tão cruel quanto o de uma serpente. — Hum, então ótimo. Já que vocês têm corações tão bondosos, cuidem dele bem direitinho. Considerem isso como uma forma de acumular boas ações. Eu segui o raciocínio dela sem me importar, jogando suas palavras de volta. Isso a deixou sem reação por completo. Desliguei o telefone. O advogado, que ainda estava no meu escritório, acabou ouvindo parte da conversa, e, mesmo sendo um estranho, parecia cheio de pena de mim. — Srta. Kiara, parece que ma
— Ouvi dizer que a família dele é muito bem de vida. Eles não se importam com o fato de você já ter sido casada? — Camila perguntou, em tom provocador.Eu não consegui segurar e soltei uma risada seca antes de responder:— E daí que eu fui casada? Não matei ninguém, nem cometi nenhum crime.Camila suspirou com impaciência:— Você é impossível, Kiara. Eu só estava tentando mostrar preocupação, e você responde assim, sem educação.— Obrigada pela sua preocupação, então. Mas estou ocupada, se não for nada urgente, vou desligar.Eu já estava prestes a encerrar a ligação quando ela, apressadamente, me chamou:— Kiara, espera! Ainda preciso falar com você!Suspirei, sentindo que já sabia onde aquilo iria parar, mas voltei o telefone ao ouvido.— Fala logo.— Então… você sabe que seu pai está doente, não sabe? A situação dele é bem grave.Ah, claro. Depois de todo aquele rodeio, ela finalmente chegou ao ponto. O verdadeiro assunto era Carlos.— Que doença? Ele vai morrer quando? — Perguntei,
Eu me encostei no peito dele, sentindo as vibrações de sua respiração, enquanto um profundo sentimento de culpa tomava conta de mim. Pensar que ele era tão bom comigo, enquanto eu ainda insistia em manter uma distância, fazia com que eu me sentisse ainda pior. Mas, por mais que eu quisesse, simplesmente não conseguia abrir meu coração para ele por completo.— Jean… — Chamei com a voz rouca, encostando no peito dele.— Hum? — Ele abaixou a cabeça, e sua respiração quente roçou meu ouvido.Eu o empurrei levemente, criando um pequeno espaço entre nós. Respirei fundo para controlar as emoções e, com uma insegurança evidente, perguntei:— Você realmente não está nem um pouco bravo comigo?Ele ergueu a mão e, com delicadeza, enxugou as lágrimas que haviam escapado pelos meus olhos. Com uma calma impressionante, ele respondeu:— Você já está passando por algo suficientemente difícil e doloroso. Se eu ainda ficasse bravo, só faria você se sentir pior.Eu o encarei, incapaz de conter a profunda