— Então você acabou de descobrir? — Perguntei, olhando para Davi com um sorriso sarcástico. — Clara e Tiago são meus irmãos por parte de pai.Davi arregalou os olhos, ainda mais surpreso:— Irmãos por parte de pai? Mas eles só são dois anos mais novos que você...— Exatamente. Meu querido pai, que não vale nem o chão que pisa, começou a trair minha mãe quando eu tinha só um ano. Talvez antes. Ele fez de tudo para forçá-la a pedir o divórcio, só para poder trazer Isabela e a família dela para dentro de casa.O olhar de Davi oscilava entre Carlos e Isabela, o choque evidente em seu rosto.— Você nunca me contou isso... — Murmurou ele, quase para si mesmo, a voz carregada de um peso que eu não conseguia decifrar. Era como se ele percebesse, naquele instante, o quanto havia errado comigo.— Por que eu contaria? — Retruquei, fria. — Você acha que eu sairia espalhando o lixo da minha família por aí? Além disso, você não é “tão inteligente”? Como nunca percebeu?Continuei, com uma risada amar
— Você tomou remédio para dormir? — Perguntou a enfermeira, franzindo o cenho.— Sim, tomei duas pílulas antes de dormir. Até agora... — Olhei para o relógio eletrônico na porta da sala de emergência. — Deve fazer umas quatro horas.A enfermeira balançou a cabeça imediatamente:— Assim não dá. O exame de sangue vai reprovar.Dei de ombros, abrindo as mãos num gesto despreocupado, e olhei para eles, que estavam com os olhos arregalados de choque. Disse, devagar:— Desculpa, mas não é que eu não queira ajudar. É que realmente não posso.Carlos quase explodiu, sua voz ecoando pelo corredor:— Kiara, você está nos enganando! Sabia que não podia doar sangue e ficou quieta?— Isso não é justo. — Fingi inocência, piscando os olhos. — Foi o Davi que me arrastou à força de casa. Eu não sabia de nada.Passei os olhos por cada um deles, como se estivesse me divertindo com a situação.— Kiara, você... — Davi me encarou com os dentes cerrados, a frustração evidente em cada palavra. Mas, no fim, ele
— Desculpa, eu tô sem celular, não consigo pedir pelo aplicativo. — Expliquei, um pouco constrangida.A garota sorriu, tranquila:— Nem esquenta. Eu ainda nem ativei o sistema de corridas. Quando você chegar em casa, paga o que achar justo.Fiquei ainda mais surpresa, sem palavras por alguns instantes.Passei o endereço da minha casa, e a jovem digitou o destino no GPS. Com um leve movimento no volante, ela saiu do estacionamento.Não havíamos rodado muito quando o celular dela tocou. Ela colocou um fone de ouvido Bluetooth e atendeu:— Oi, mano... Eu já tô saindo, tá? Pede pro motorista te buscar... Ah, foi tudo de última hora, nem deu tempo de te avisar. Depois eu explico... Relaxa, quando eu te contar, você vai concordar que fiz a coisa certa! Tá, tá, tô dirigindo, depois a gente fala.Enquanto ela falava, olhei automaticamente para o retrovisor. Algo chamou minha atenção. Na calçada em frente ao hospital, uma figura masculina alta e elegante. O sol da manhã iluminava suavemente seu
A confusão no casamento me colocou nos trending topics. Quando acordei e peguei o celular, uma avalanche de notificações e chamadas de números desconhecidos quase fez o aparelho explodir. Suspirei, sabendo que o verdadeiro problema estava só começando.Em menos de dois dias, meus dados pessoais e informações da empresa foram divulgados na internet. A situação ficou cada vez mais difícil de controlar.Naquela manhã, ao chegar na empresa, mal saí do carro e já fui cercada por uma multidão de jornalistas que estavam de plantão na porta. Felizmente, Tatiana já estava preparada e, com a ajuda dos seguranças, conseguiu me tirar daquela emboscada.O mais revoltante era que, mesmo Clara sendo a culpada por tudo, ela virou um símbolo de piedade por causa da doença. Os internautas começaram a me atacar em massa. Não só fui alvo de ofensas pessoais, como a loja oficial da empresa também foi invadida por críticas e boicotes, prejudicando as vendas e quase paralisando as operações.O setor de relaç
Eu não disse nada. Apenas dei a volta na mesa e saí, tentando evitar qualquer confronto.Davi veio atrás de mim, insistindo:— Kiara, eu sei que, por enquanto, você não vai conseguir me perdoar, mas nós temos uma história de seis anos. Não dá pra simplesmente apagar isso, nem pra você, nem pra mim. A pessoa que eu amo é você, isso nunca vai mudar. Mas a Clara... Eu a vi crescer, ela sempre foi sensível, frágil, e agora, com essa doença terminal, está ainda mais vulnerável. Sempre a tratei como uma irmã. Como posso simplesmente deixá-la de lado?Ele bloqueou meu caminho, e minha paciência se esgotou de vez.— Davi, você tá maluco? — Explodi. — Eu nunca te proibi de ser bom com ela! Mas por que você acha que pode vir aqui com esse papo absurdo? O que você quer com isso? Me fazer sentir ainda pior?Davi segurou meu braço, tentando me acalmar com a voz baixa:— Kiara, eu sei que você tem passado por muita coisa. Eu só quero ajudar.— Ajudar? — Soltei uma risada sarcástica, empurrando-o e d
Bela ajeitou a postura, ficando um pouco mais séria:— Clara pode até gostar um pouco de você, Davi, mas não é esse amor todo que você acredita. Ela quer casar com você por pura provocação, só pra machucar a Kiara.Davi deu um sorriso enigmático, como se não se importasse, e respondeu com desdém:— Essas ideias foram a Kiara que colocou na sua cabeça, não é? Clara não é assim. Ela é inocente, doce. Tá, às vezes é um pouco mimada, mas nunca teria essa maldade que você tá insinuando.A expressão de Bela era de puro desprezo, como se estivesse olhando para o maior dos tolos:— Você... Parece ser um cara inteligente, mas quando cai nas garras de uma mentirosa, sua cabeça vira um ovo cozido.Eu não me segurei e dei uma risadinha.Davi nos encarou com o rosto carregado, claramente ofendido. Ele parecia sem graça, e então, virou-se para ir embora.Mas Bela não ia deixá-lo sair tão fácil.— Clara sempre teve inveja da Kiara. — Disparou Bela, sua voz carregada de convicção. — Ela não suporta ve
Bela soltou um riso irônico:— Aposto que, no começo, ela só queria roubar seu homem. Mas foi se metendo tanto no papel que acabou acreditando na própria encenação.Fiquei de boca aberta, sem saber o que responder.— O Davi diz que não acredita, mas duvido que ele não tenha suas dúvidas. Pode esperar, logo-logo eles vão começar a brigar. Minha tia-avó sempre diz que o tratamento de câncer é uma barra. Parece que a Clara faz um escândalo todos os dias no hospital, dá trabalho pra todo mundo. Os médicos e enfermeiros já foram trocados várias vezes porque ninguém consegue lidar com ela. Agora me diz: até onde vai o amor de um homem por uma mulher? Quanto tempo ele aguenta antes de se desgastar? E olha que nem sabemos se o que eles têm é amor de verdade. — Continuou Bela.Assenti com a cabeça e comentei:— Com isso que você falou, faz todo sentido o Davi ter vindo me procurar hoje com aquele jeitinho todo simpático.Provavelmente, ele já não aguenta mais as "crises" da Clara. Deve estar l
— Ai, Kiara, você tá tão atolada que nem pensa direito! — Exclamou Tatiana, quase rindo. — Olha ao redor, tem outro Condomínio Florensa na cidade? É claro que é a família Auth da Serra Montanha, aquela cuja linhagem vem de um dos fundadores do país! Geração após geração, eles sempre foram uma das famílias mais respeitadas e influentes. E, além disso, super discretos. Nunca aparecem muito na mídia. Agora, do nada, eles vêm atrás de você pra fazer um vestido pra Sra. Auth? Se isso vaza, você tem ideia de quantas outras famílias da alta sociedade vão começar a querer o nosso trabalho? Vai ser um boom pro nosso nome!O gerente de marketing, que estava ali ao lado, quase gritou de empolgação:— Chefe, é agora que a gente vai decolar de vez!— Peraí! — Levantei, tentando manter a calma, e olhei para Tatiana. — Você não acha que devia verificar com a polícia? Vai que é golpe?Tatiana revirou os olhos tão dramaticamente que achei que fosse desmaiar:— Eu já chequei tudo! Confirmei três vezes!
— Meu irmão já está assim, e você ainda vem pressioná-lo. Você não tem um pingo de humanidade? — Tânia gritou, furiosa.— O estado do seu irmão não é culpa minha. Então, por favor, pare com esse discurso moralista. — Eu respondi, pegando de volta o acordo de divórcio, que ela havia tomado de mim, e dei dois passos à frente para colocá-lo sobre o criado-mudo ao lado da cama. — Davi, vou repetir: eu salvei sua vida, fui além do que qualquer pessoa faria. Foi você quem me traiu primeiro, então não me culpe por estar sendo fria agora. Assine logo o acordo de divórcio e, pelo menos uma vez, faça o que é certo.Davi me encarou fixamente. Quando terminei de falar, ele levantou a mão devagar e pegou o documento.Eu pensei que ele fosse rasgá-lo e avisei:— Eu trouxe várias cópias. Rasgar essa não vai adiantar nada.Mas, para minha surpresa, ele deu uma olhada no acordo, girou o papel levemente na minha direção e disse apenas uma palavra:— Caneta.Eu fiquei paralisada por um instante, sem ente
Eu já tinha até organizado um "grupo de apoio", e ele me vem com essa de fugir na última hora. Agora, eu precisava avisar as tias e senhoras que fazem parte do grupo para não irem ao tribunal amanhã. Quanto ao próximo passo, iria avisá-las no momento certo.Essas mulheres, todas empolgadas com o desconto vitalício de 60% nos produtos da minha marca, estavam sempre de prontidão e dispostas a ajudar.Ficar parada nunca foi meu estilo. Depois de pensar durante boa parte da noite, decidi que no dia seguinte eu iria visitar o canalha.Eu imaginei que, se ele estava doente, provavelmente teria procurado o médico que sempre o acompanhava. Quando cheguei ao hospital, acertei: ele estava lá.Eduarda e Tânia também estavam no local. Quando elas me viram, ficaram claramente surpresas.Tânia foi a primeira a se manifestar, com o tom irritado de sempre:— O que você veio fazer aqui? Meu irmão já pediu o adiamento da audiência. Agora vai persegui-lo no hospital e arrastá-lo à força para o tribunal?
Além disso, será que Jean já percebeu que eu também estou interessada nele? Esse assunto não podia continuar. Se deixássemos as coisas claras demais, talvez nem como amigos conseguíssemos continuar.Depois de um breve silêncio, mudei de assunto:— A propósito, a Bela mencionou um jantar. Que dia você está livre?— No fim de semana, se você tiver tempo. — Respondeu Amélia.— Certo, eu organizo.Quando chegamos na empresa, eu liguei o computador e mostrei para ela uma série completa de croquis de vestidos de gala, dizendo que ela podia escolher à vontade.Amélia ficou surpresa:— Como você conseguiu criar tantos?— Esses são os esboços que estou preparando para a Semana de Moda de Milão, em fevereiro do ano que vem. Assim que terminar os compromissos atuais, vou focar totalmente nisso. — expliquei.— Uau... São incríveis! — Amélia exclamou, admirada, e depois acrescentou, visivelmente emocionada. — Isso deve ser confidencial, não? E você está me mostrando tudo assim? Você confia mesmo em
Bela sorriu e disse:— Da próxima vez que vierem, eu pago. Peçam o que quiserem.Depois, Bela olhou para mim e lembrou:— Kiara, organize seu tempo e me avise quando marcar.— Sério? — Perguntei, um pouco surpresa.— Claro! Essa refeição de hoje já deveria ter sido por minha conta, mas cheguei de viagem e vocês já tinham terminado.Enquanto ainda conversávamos, o secretário de Jean, Leonardo, aproximou-se apressado:— Sr. Jean, o carro chegou.Bela entendeu a situação imediatamente e disse:— Então está combinado. Sei que todos estão ocupados, não vou segurar vocês.— Certo, até mais, Bela. — Amélia acenou para ela enquanto saíamos juntos.Jean estava com pressa, e seu carro já o aguardava na entrada do restaurante. Leonardo abriu a porta traseira com antecedência, e Jean entrou no veículo com elegância:— Eu vou indo. Divirtam-se.— Tchau! — Eu observei através da janela abaixada aquele rosto impecavelmente bonito e tentei conter a emoção que me invadia.O Audi A8 partiu devagar, e Am
Eu olhei para o lenço dele, hesitei um pouco e então o peguei:— Obrigada.Ao lembrar que ainda havia outro lenço dele comigo, apertei este entre os dedos, sentindo meu coração disparar mais uma vez. Depois de enxugar os cantos dos olhos e me acalmar, segurei o lenço com certa vergonha:— Hum... Eu lavo e depois devolvo...— Não precisa, me dá aqui. — Antes que eu terminasse a frase, Jean me interrompeu e estendeu a mão para pegar o lenço de volta.Minhas bochechas queimaram de vergonha. Baixei a cabeça e foquei em comer o que estava no prato. Depois de terminar, chamei o garçom para pedir a conta, mas ele me informou:— Srta. Kiara, a conta já foi paga.— Já foi paga? Por quem? — Perguntei, surpresa.Antes que o garçom pudesse responder, Amélia disse com leveza:— Meu irmão já pagou, vamos!Eles se levantaram, e eu os segui, mas extremamente sem graça:— Sr. Jean, havíamos combinado que seria eu a pagar, para agradecer pela ajuda que você me deu outro dia. Por que você pagou de novo?
Eu admirava Jean do fundo do coração. Respeitava-o, apreciava-o, e desejava sinceramente que ele fosse cada vez melhor. Não queria que nada estragasse isso, que ninguém manchasse a sua imagem nem mesmo eu. Por isso, preferia não dizer nada, deixar as coisas como estavam, nesse limbo de ambiguidade, e me consolar com a ideia:"Nós somos apenas amigos."— E aí, conseguiu resolver os problemas da sua família? — Enquanto eu me perdia nesses pensamentos, Jean e Amélia já haviam começado a comer, conversando casualmente e demonstrando preocupação comigo.Assenti com a cabeça:— Digamos que sim. Meu pai foi preso, as provas contra ele são incontestáveis. Consultei um advogado e é certo que ele terá que responder pelos crimes. Agora, só falta saber quantos anos de condenação ele vai pegar. Mas, de qualquer forma, voltar à miséria é inevitável.Por dentro, eu pensava:“Se o fisco decidir pesar a mão, talvez ele ainda saia dessa com dívidas. E aí, recomeçar seria impossível.”Jean me ouviu com a
De qualquer forma, eu mesma me convenci:“Somos apenas amigos. Amigos que, de vez em quando, se encontram para almoçar. Nada mais normal do que isso.”Meia hora depois, cheguei ao Bom Sabor. O gerente do restaurante me reconheceu e, assim que me viu, disse:— Srta. Kiara, seu convidado já chegou. Está na sala privativa número um.— Ah, obrigada.Meu coração deu um salto, e, enquanto caminhava, acabei acelerando o passo, quase correndo.O garçom abriu a porta da sala para mim, e meu rosto já trazia um sorriso iluminado:— Sr. Jean…Mal terminei de falar, vi uma garota sentada ao lado dele. Meu rosto passou de surpresa a alegria em questão de segundos:— Ué? Amélia, você também veio?Amélia sorriu docemente:— Ué, não posso vir? Vai me dizer que tô atrapalhando o momento de vocês dois?Minhas bochechas ficaram quentes. Automaticamente, olhei para Jean, nervosa e sem saber onde enfiar a cara:— Claro que eu queria que você viesse.Quanto ao comentário sobre "o momento de vocês dois", fing
Cheguei ao estacionamento, abri a porta do carro e me sentei. Depois de colocar o celular no suporte com o viva-voz ativado, virei-me para colocar o cinto de segurança.— Denunciei meu próprio pai. Ele com certeza vai para a cadeia. Vim contar isso para a minha mãe, para que ela possa ficar feliz lá no outro mundo. — Falei, sem o menor peso na consciência.Jean riu levemente do outro lado da linha:— Você é rápida mesmo.Meu tom de voz era puro alívio e satisfação:— Claro, né? Se eu não fosse, ia acabar pagando o pato por ele. Gastar dinheiro ainda vai, mas correr o risco de ir parar na prisão? Nem pensar!— Direta e eficiente. Estou impressionado de novo.— Obrigada pelo elogio, Mestre Jean. — Brinquei, ligando o carro. Depois voltei ao assunto. — Mas e aí, por que você me ligou?— Nada demais. Só queria saber se o ferimento no seu braço já melhorou.Ao ouvir isso, foi que me lembrei do corte no meu braço direito. Eu estava tão ocupada que tinha esquecido completamente. Levantei o br
O policial, sem paciência para continuar ouvindo Carlos, virou-se para mim e perguntou:— Srta. Kiara, poderia nos acompanhar até a delegacia? De acordo com o protocolo, precisamos registrar seu depoimento.— Claro. — Respondi.Afinal, fui eu quem fez a denúncia. Era minha obrigação colaborar com a investigação.Carlos foi levado algemado. Os funcionários de sua nova empresa assistiram à cena sem saber o que dizer, completamente atônitos. Pobres coitados... Mal haviam começado a trabalhar e já teriam que procurar outro emprego, porque a empresa estava fadada a fechar as portas.Fui até a delegacia com os policiais e, após colaborar com todo o procedimento e terminar o depoimento, já era sete da noite. Quando saí, olhei para as luzes da cidade que brilhavam por toda parte e senti uma saudade profunda da minha avó. Resolvi então dirigir até a casa dela para jantar.Contei-lhe toda a história, desde o início até o desfecho. Ela ficou visivelmente contente:— Finalmente eles estão pagando