Capítulo 0004

Evandra apertou o teste de gravidez entre os dedos.

— Ainda não tenho certeza.

Mas o atraso e os sintomas dos últimos dias deixavam poucas dúvidas.

— E se for verdade...? O que você vai fazer? — Clarissa hesitou, olhando-a com preocupação. — Você acha que o Valério aceitaria?

Evandra abaixou os olhos.

Valério não iria querer um filho dela.

Eles já tinham se divorciado.

Manter essa criança não seria bom para ninguém.

Mesmo que...

Mesmo que um dia ela tenha desejado esse filho com todas as forças.

— Não. — Ficou um longo tempo em silêncio antes de murmurar, com uma voz sem emoção. — Não tem por que insistir numa coisa dessas. Se for real... melhor interromper.

Ela esperou por três anos. Esperou, mas nunca aconteceu.

Agora, era tarde demais.

Sem ânimo para encarar a verdade, não fez o teste ali. Em vez disso, puxou Clarissa para beberem um pouco. Algo leve, apenas para distrair a mente.

No dia seguinte, de volta à empresa, lembrou-se do exame esquecido.

Foi ao banheiro e, quando finalmente viu as duas linhas vermelhas, congelou.

Estava grávida.

Do filho de Valério.

Seu rosto empalideceu.

Nesse momento, alguém entrou no banheiro. Num reflexo, jogou o teste no lixo, mas seus dedos ainda tremiam.

Ela realmente iria tirar o bebê deles?

Uma pontada cortante atravessou seu peito.

Passou o dia absorta, sem conseguir focar. Quando a reunião terminou, ouviu sussurros ao seu redor.

— Você soube? Alguém do setor de projetos está grávida.

No Grupo Linhares, a competitividade era feroz.

Uma gravidez poderia atrapalhar qualquer carreira.

— Quem será? Tá escondendo bem... — comentou alguém, com um tom quase divertido.

Evandra sentiu o coração acelerar.

Levantou o olhar e encontrou os olhos escuros de Valério fixos nela.

Pouco depois, a voz baixa e firme dele soou:

— Srta. Evandra, venha até meu escritório.

Os dedos dela se fecharam ao redor da barra da saia.

Assim que Evandra entrou no escritório, Valério foi direto ao ponto:

— Vou agendar um exame para você.

O coração dela deu um salto.

— … Não sou eu quem está grávida.

A resposta saiu hesitante, mas Valério a cortou sem dar espaço para discussão:

— Por precaução. Você não quer que isso vire um problema, quer?

Ela não conseguiu recusar.

Engoliu a inquietação e assentiu.

— Certo.

Ao sair, ela deu de cara com Mirabel, que se apressou em sua direção.

Mordendo os lábios, falou em tom nervoso:

— Evandra, aquilo foi um mal-entendido. Você não me culpa, né? Eu não fazia ideia de que a família Souto seria tão desprezível a ponto de trocar a mercadoria!

Evandra manteve-se impassível.

— Não tem nada a ver comigo. A empresa tem suas próprias regras. Você cometeu um erro, arque com as consequências.

Entre as duas, nunca houve muito a dizer.

No mínimo, Evandra sempre separou o pessoal do profissional. Não via sentido em misturar as coisas.

Mirabel, aliviada, mudou de assunto.

— Semana que vem é o aniversário do papai. Ele sente sua falta. Que tal voltar para casa? Podemos celebrar juntos, como uma família.

O aniversário de Pedro caía exatamente no dia da morte de sua mãe.

Evandra não perdeu tempo:

— Não estou interessada em joguinhos. Se não for completamente burra, deveria saber que esse dia não significa nada além de dor para mim e para minha mãe.

Mirabel ficou sem graça, mas logo rebateu, com um tom quase ofendido:

— Eu sei que é o aniversário de falecimento dela, mas os mortos não voltam, e o aniversário do papai continua sendo um dia especial. Assim como eu nunca te culpei por sua mãe ter me mandado para o interior, você também podia deixar isso para trás e parar de guardar rancor dele.

Evandra riu, mas o riso foi frio.

— Você sabe muito bem porque minha mãe te mandou para lá.

Seu olhar se tornou cortante.

— Se um dia eu perdoasse alguém que destruiu a vida dela e ainda me sentasse à mesa para comemorar, isso não faria de mim uma pessoa generosa. Apenas uma sem caráter.

O rosto de Mirabel empalideceu na hora.

Os olhos de Mirabel se encheram de lágrimas, prestes a cair.

— Eu não quis dizer nada de mal, só que…

— Não me importo com o que você pensa. — Evandra a cortou, fria. — Aqui, somos apenas colegas de trabalho. Foque no seu serviço.

Virou-se e saiu. Não tinha tempo nem paciência para joguinhos infantis.

Naquela tarde, pediu licença e foi ao hospital em segredo.

Não fazia ideia de que, ao mesmo tempo, Mirabel, nervosa e distraída, acabaria torcendo o tornozelo e sendo levada ao hospital por Valério.

— Parabéns, seis semanas de gestação.

Ao sair da consulta, segurando o exame nas mãos, Evandra deu de cara com Valério ajudando Mirabel a sair.

As palavras do médico ainda ecoavam em sua mente:

"Seu corpo não está em condições para um aborto. Se interromper a gravidez, pode ser muito difícil engravidar no futuro. Pense bem antes de decidir."

O gosto amargo na boca foi inevitável.

Ela estava esperando um filho de Valério.

Desde o primeiro instante, havia sentido alegria e expectativa.

Mas… Valério permitiria que esse bebê nascesse?

Seu olhar perturbado foi captado por ele à distância.

Mirabel, hesitante, a chamou com a voz meio trêmula:

— Srta. Evandra…

Os olhos de Valério pousaram nela.

— O que está fazendo aqui?

O coração de Evandra disparou. Escondeu o exame atrás das costas.

— Estava resfriada há alguns dias. Vim para um check-up.

Valério estreitou os olhos, analisando-a com atenção.

Mirabel percebeu algo estranho e, puxando de leve a manga dele, murmurou, desapontada:

— Vocês devem ter algo para conversar. Eu posso ir sozinha.

Ele franziu levemente o cenho, mas não insistiu.

— Vou pedir para alguém te levar.

Ela assentiu com docilidade.

Evandra soltou um suspiro discreto e, sem pensar, amassou o exame, enfiando-o no fundo da bolsa.

No carro, Valério a olhou de relance, a expressão neutra.

— Está tão nervosa assim?

Sua voz saiu arrastada, provocativa.

— Se continuar assim, vou acabar achando que você realmente está grávida.

Ela abriu a boca para negar, mas hesitou.

Em vez disso, forçou um sorriso e devolveu a pergunta:

— E se eu estivesse? O que o Sr. Valério faria?

— Arranjarei uma cirurgia para você .

As palavras caíram como uma lâmina afiada.

Ele a fitou direto nos olhos, sem um segundo de hesitação.

Ela já sabia.

Era óbvio que seria assim.

Uma dor fina e persistente se espalhou pelo peito de Evandra.

Forçou um tom indiferente e balançou a cabeça.

— Só um resfriado.

Valério estreitou os olhos, analisando-a em silêncio antes de falar:

— Ouvi dizer que você teve um desentendimento com Mira hoje. Ela torceu o pé na saída.

Pausou, como se escolhesse as palavras.

— Mira ainda é jovem, ingênua. Mas tem um bom coração e não costuma brigar com ninguém. Você devia ter mais paciência com ela, não precisa ser tão dura.

Um gosto amargo subiu à boca de Evandra.

Preferências.

No fim das contas, ninguém estava imune a elas.

— Ela não é uma criança. E eu não tenho nada para ceder.