Eu simplesmente não conseguia acreditar. Mas aquela caligrafia... era inconfundível. Na última vez que nos encontramos para negociar o empréstimo de trezentos milhões, a assinatura dele era exatamente assim!Meu Deus... A quantidade de perguntas se acumulava na minha cabeça como um turbilhão. Como Jean me encontrou? Por que ele me trouxe de volta para casa? Quando foi que ele foi embora? E aquelas memórias fragmentadas que eu tinha... abraços, carinhos, até mesmo um beijo... eram um sonho ou realmente aconteceram?E o mais surpreendente de tudo: alguém como ele, com tanto poder e prestígio, realmente entrou na minha pequena e apertada cozinha de um apartamento alugado para preparar meu café da manhã?A confusão na minha mente era tanta que parecia que ela ia explodir. Nem me lembrei de beber água. Virei-me e corri para a cozinha. E lá estavam: pães assados no forno, café mantido quentinho, pedaços cortados de salmão defumado e abacate, e até ovos fritos perfeitamente cozidos.Suspirei,
“Mas se ele não quer nada em troca, por que ele está sendo tão bom comigo? Será possível que, em meio a tanta gente nesse mundo, ele tenha ignorado todas as mulheres perfeitas e, justamente, se apaixonado por mim, uma herdeira sem prestígio, de uma família pequena e irrelevante?”Pura fantasia.Senti vergonha de mim mesma por ter esses pensamentos absurdos. E, claro, havia o tal Patek Philippe… Eu nem sabia o que fazer com ele.Sem coragem de ligar para ele, a única coisa que eu podia fazer era esperar que ele me procurasse primeiro. Afinal, um relógio de mais de um milhão de reais não é algo que se deixa simplesmente de lado, certo? Mas esperei o dia inteiro, até o anoitecer, e nada. Jean não me ligou.Na segunda-feira, chegou o meu verdadeiro aniversário. A festa de ontem foi apenas uma comemoração adiantada que a Bela organizou para mim.À tarde, o Carlos me ligou. Assim que atendi, veio a bronca, sem rodeios:— Você acha que pode brincar com a cara de todo mundo? Faltou à reunião c
Davi entrou segurando um bolo em uma mão e, na outra, algumas caixas de presente. Depois de trocar os sapatos, caminhou até a sala de jantar.— Kiara, feliz aniversário! Trouxe um bolo e alguns presentes para você. Dona Cecília, essas lembrancinhas são para a senhora.Ele levantou os presentes com um sorriso largo, tentando ser simpático. Minha avó e a Tia Júlia trocaram um olhar breve, claramente constrangidas. Por educação, minha avó esboçou um sorriso discreto e respondeu:— Obrigada pelos presentes, mas eu não preciso disso. Leve de volta para sua mãe e seu pai, eles vão aproveitar mais.Antes que Davi pudesse responder, levantei-me da cadeira, com o rosto fechado, e fui direta:— O que você está fazendo aqui? Quem te chamou? Perdeu a vergonha na cara?— Kiara, hoje é o seu aniversário… — Disse ele, tentando parecer cauteloso, mas visivelmente desconcertado.— Meu aniversário não tem nada a ver com você! Ninguém aqui te quer por perto. Vai embora! — Retruquei, sem esconder o despre
Lancei um olhar de desprezo para ele, sem a menor vontade de dar atenção, e continuei andando, passando por ele sem dizer nada.Mas Davi se virou rapidamente e me segurou pelo braço, puxando-me com força para os seus braços:— Kiara, eu errei. Me dá mais uma chance, por favor? Eu te amo, não posso te perder! Pelos seis anos que vivemos juntos, me deixa provar que posso mudar… só mais uma chance!Ele me apertava com força, os braços como um grilhão, enquanto despejava sua suposta sinceridade em um tom desesperado. Eu tentei me desvencilhar, empurrá-lo, bater nele, mas ele não soltava. Era sufocante, como se o toque dele fosse cheio de espinhos. Sem outra saída, levantei o pé e pisei com toda a força no peito do pé dele. Ele soltou um grito abafado de dor, afastando-se instintivamente, e eu aproveitei para empurrá-lo de vez.— Davi, você não tem vergonha? Depois de tudo o que fez, acha que merece perdão? — Perguntei, com a voz baixa, mas carregada de fúria, o olhar fixo e ameaçador.Ele,
Por dois dias seguidos, fiquei encarando o Patek Philippe sem motivo, perdida em pensamentos. Achei que, por ser um relógio tão caro, Jean ligaria imediatamente para perguntar sobre ele. Mas, para minha surpresa, dois dias se passaram e ele não deu nenhum sinal.Será que ele nem percebeu que o relógio ficou comigo? Ou talvez ele tenha tantos relógios luxuosos que nem se importa de perder um?Pouco antes do fim do expediente, abri o calendário na minha mesa para organizar as tarefas dos próximos dias. Sem querer, notei que depois de amanhã era o aniversário da Sra. Auth. Quando fui ao Condomínio Florensa tirar as medidas para o vestido dela, ela mencionou a data, e eu fiz questão de anotar assim que voltei.Embora eu não fosse importante o suficiente para ser convidada para o evento da família Auth, lembrei que a Sra. Auth sempre foi gentil comigo. E Jean… bem, ele também me ajudou bastante. Por isso, pensei que uma lembrança de agradecimento seria uma boa ideia.Mas, depois de preparar
— Certo, estarei lá agora mesmo. — Disse Jean.— Tudo bem, eu também estou a caminho. — Respondi.Peguei o presente e o relógio, tentando controlar o caos no meu peito, e saí apressada do escritório. Achei que chegaria antes dele, mas, ao entrar no terraço do café, minha expectativa foi completamente contrariada. Jean já estava lá.Ele era impossível de ignorar. Em qualquer lugar onde estivesse, sempre parecia ser o centro de tudo, o ponto mais brilhante. Naquele fim de tarde de outono, com o sol dourado derramando sua luz suave, ele parecia ainda mais deslumbrante.Jean havia tirado o paletó, que estava cuidadosamente dobrado ao lado. Vestia apenas uma camisa branca, com as mangas dobradas até os cotovelos, revelando os antebraços fortes e bem definidos.Sobre a mesinha baixa à sua frente, estava um laptop ultrafino, e ele parecia concentrado em algum trabalho, o rosto sério, quase frio. Atrás dele, flores roxas desconhecidas floresciam exuberantes, criando um contraste vibrante com o
— Não. — Jean respondeu com seriedade, explicando. — Na nossa família, os Auth, não temos hábitos de consumo extravagantes. Não somos do tipo que só usa marcas famosas. Se gostamos de algo, se nos agrada, mesmo que seja um objeto encontrado em uma lojinha de rua, ele se torna especial.Eu fiquei impressionada com aquilo. Olhei para ele e acenei com a cabeça, concordando. Antes que pudesse dizer algo, o garçom chegou com os pedidos, interrompendo a conversa.Dei alguns goles no meu chocolate quente, e o sabor doce e reconfortante pareceu acalmar um pouco meu nervosismo. Aos poucos, me senti mais relaxada, menos tensa. Então, lembrei da dúvida que me atormentava há dias. Coloquei a xícara de volta na mesa e perguntei, curiosa:— Sr. Jean, naquela noite de domingo... como foi que o senhor me encontrou?Jean tomou um gole de seu café, e só depois de engolir respondeu com calma:— Foi por acaso. Eu estava indo buscar outra pessoa e acabei te encontrando.Sorri, agradecida, e disse com since
O quê? Meu rosto ainda estava... se partindo. Eu mal conseguia processar a situação. Vomitar era a coisa mais nojenta do mundo, o cheiro era insuportável. E pensar que um herdeiro de uma família tão rica e poderosa cuidou disso para mim, limpando algo tão repugnante? Não era de se estranhar que, quando acordei no dia seguinte, o lixo já estivesse impecavelmente limpo. Ele mesmo deve ter tratado de tudo naquela noite.— Quando cheguei em casa, percebi isso, mas... não tive coragem de te ligar. Hoje trouxe para você pessoalmente. — Jean continuou falando, aparentemente alheio ao meu evidente desconforto.Essas palavras cutucaram uma parte sensível da minha mente, despertando minha curiosidade. Olhei para ele, ainda confusa, e perguntei, hesitante:— Você... não teve coragem de me ligar?Jean deu um sorriso discreto, e seus olhos brilhavam como se guardassem um universo inteiro. Por um momento, ele parecia até um pouco envergonhado:— Sim. Tive medo de que você, ao ver o relógio, pensasse
— Tudo bem, eu vou. — Fingi ter cedido à chantagem de Tânia, como se ela tivesse conseguido me manipular.Depois de desligar, me dei ao luxo de refletir com mais calma. Era verdade que havia certa tensão e flerte entre mim e Jean, mas nunca tivemos qualquer interação pública que pudesse ser considerada íntima ou comprometedora.Com a personalidade de Tânia, se ela realmente tivesse algo sólido contra mim, já teria usado isso há tempos para me humilhar publicamente. Não esperaria até agora, quando minha relação com Davi estava prestes a acabar, para jogar suas cartas.Provavelmente, esse "vídeo" que ela mencionou não mostrava nada relevante. Era mais uma tentativa desesperada de me assustar, de me fazer recuar, talvez até de ajudar Davi a reverter a situação.Ao entender isso, me senti mais tranquila. Ainda assim, decidi ir ao encontro dela. Não por mim, mas por Jean. A posição dele era delicada, e eu não podia correr o risco, por menor que fosse, de algo prejudicar a reputação dele.Po
— Se ainda não decidiram, talvez não seja o momento certo para se divorciarem. Problemas acontecem em qualquer casamento, e uma boa conversa pode resolver. — O funcionário empurrou os papéis da separação de volta para nós, tentando nos convencer a desistir.Fiquei irritada imediatamente. Virei o rosto para Davi e, em um tom baixo e severo, questionei:— O que você está tentando fazer? Mesmo que você adie hoje, não vai escapar da audiência no tribunal na quinta-feira. Por que insistir nisso?Davi manteve o olhar fixo no meu, com uma expressão indecifrável. Depois de alguns momentos de silêncio, ele finalmente respondeu ao funcionário:— Estou aqui por vontade própria. Nosso relacionamento acabou. Não há mais como voltar atrás.Soltei um suspiro aliviado, embora ainda estivesse tensa.— Certo, então… — O funcionário pegou os documentos novamente, assumindo seu tom profissional. — A partir de hoje, começa o período de 30 dias de reflexão obrigatória. Durante esse tempo, qualquer uma das p
A liberdade de se vestir como quiser era, de fato, uma escolha pessoal. Mas, em certas situações, a exposição involuntária de partes do corpo feminino pode, infelizmente, colocar uma mulher em perigo. Isso também é uma realidade.Lembrei-me de uma aula de Direito Penal que fiz na faculdade. O professor mencionou que, do momento em que um homem é estimulado até sentir um impulso, podem bastar apenas 40 segundos. Como Jean disse, alguns homens podem, em um instante, se transformar em verdadeiros predadores.— Então, vou indo. Obrigado pelo trabalho. — Jean inclinou levemente a cabeça, com a mesma cortesia de sempre.Eu ainda estava com o rosto em chamas e, como de costume, falei de forma completamente desajeitada:— N-não foi nada… Assim que as roupas estiverem ajustadas, eu… eu levo para você.— Tudo bem. — Ele respondeu calmamente.Insisti em descer com ele até a saída, mas Jean me olhou de cima a baixo e, percebendo que eu estava sem o casaco, recusou. Ele me pediu para ficar, dizendo
— Tudo bem. — Jean respondeu com um simples aceno de cabeça.Fiquei surpresa. O que ele queria dizer com isso? Ele realmente estava disposto a ficar e continuar tomando chá? Então por que, minutos atrás, ele estava tão indiferente? Não conseguia entender esse homem.Jean voltou ao sofá e se sentou para tomar o chá. Enquanto isso, minha mente trabalhava freneticamente tentando encontrar um assunto para preencher o silêncio.— A Amélia já tem data para a apresentação no exterior? — Perguntei, tentando soar casual.— Ela não me disse. Está bastante ocupada ultimamente.— Ah, entendi. Bom, já terminei o vestido dela. Quando ela tiver um tempo, pode vir experimentar. Se estiver tudo certo, ela já pode levar e não atrasa a viagem.Jean levantou os olhos da xícara de chá e me ofereceu um sorriso elegante:— Obrigado. Você tem trabalhado duro por nós, sempre cuidando de tudo com tanto capricho.Falei com sinceridade:— Não, quem deve agradecer sou eu. Vocês me dão trabalho, ajudam a construir
Meu rosto estava quente, e eu agradeci por estar de cabeça baixa, evitando que Jean percebesse. Contudo, meus olhos, inevitavelmente, se desviaram para a área da cintura dele, onde o tecido da calça formava uma leve curva.Naquele instante, minha mente me pregou uma peça, trazendo à tona um vídeo que as designers da minha equipe haviam compartilhado certa vez no grupo do trabalho. Era um clipe de um alfaiate experiente ajustando as roupas de um cliente masculino. Em certo momento, o alfaiate perguntou ao cliente de forma direta e séria: "Você costuma posicionar... à esquerda ou à direita?"O cliente ficou confuso, mas a mulher que o acompanhava entendeu imediatamente a pergunta e, envergonhada, levantou-se e saiu de perto.Lembro que, depois desse vídeo, o grupo foi tomado por discussões acaloradas. As designers que trabalhavam com moda masculina perguntaram se essa era uma prática comum. A conversa, claro, acabou descambando para piadas sobre tamanhos, posições e "certos homens que ne
— Certo. — Jean pegou o terno e caminhou em direção ao provador.Fiquei sozinha no meu espaço de trabalho, mas minha mente estava longe. Sem perceber, comecei a pensar nele, imaginando-o no provador, tirando a camisa, ajustando a roupa. E, inevitavelmente, a lembrança de quando ele me puxou no meio da rua, me segurando firme em seus braços, voltou à tona.Foi um instante tão breve, mas o impacto desse momento continuava reverberando em mim. Meu coração ainda batia mais rápido só de pensar nisso.O barulho vindo do provador me trouxe de volta à realidade. Balancei a cabeça para espantar esses pensamentos e me aproximei.Quando o vi sair do provador, fiquei sem palavras.Jean vestia o terno preto feito sob medida. O tecido se ajustava perfeitamente ao seu corpo, destacando sua postura impecável e seu porte elegante. A combinação da cor sóbria com o caimento perfeito exalava um tipo de imponência que era impossível ignorar. Ele parecia frio e distante, mas ao mesmo tempo, sofisticado e ir
— Tantas modelos paradas assim… parece que entrei em outra dimensão. — Jean comentou, com um tom de curiosidade e admiração.Eu sorri:— Sim, à noite fica ainda mais interessante.A escolha do prédio onde fica minha empresa foi algo que Davi e eu fizemos com muito cuidado no passado. Alugamos quatro andares inteiros. As três primeiras são dedicadas às áreas de trabalho, com escritórios, academia e espaço de suporte. O ambiente geral é muito agradável.Já o quarto andar, com mais de 200 metros quadrados, é exclusivamente meu. É o meu estúdio privado, meu santuário de criação.A Lustre & Gala trabalha com alta-costura, e muitas peças exigem sigilo absoluto. Meu closet contém uma coleção de peças exclusivas e acessórios valiosíssimos. Por isso, a entrada no meu espaço é extremamente restrita. Além de mim, apenas Tatiana tem acesso livre. Ninguém mais pode entrar sem minha autorização, e, mesmo que subam, não conseguem passar da porta sem permissão.— Essas são peças de alta-costura. Muito
Depois de alguns instantes em silêncio, ele finalmente falou, com o tom mais leve:— Tudo bem, vamos comer.Ao terminar a frase, Jean se levantou e voltou para o seu lugar.Eu mantive a cabeça baixa, soltando um suspiro de alívio. No entanto, uma sensação de culpa e tristeza começou a pesar no meu peito.Não tive coragem de levantar os olhos para encará-lo. Depois de um momento de silêncio, falei baixinho, com a voz abafada:— Desculpa. Eu sei que você está tentando me ajudar, mas agora eu…Eu não consegui terminar a frase. A verdade era que, nesse momento, eu não me sentia capaz de aceitar o apoio dele, nem achava que merecia. Mas essas palavras simplesmente não saíam.Por sorte, Jean parecia entender o que se passava na minha cabeça. Ele respondeu com um tom gentil e calmo:— Quem deve pedir desculpas sou eu. Fui um pouco impulsivo e ultrapassei os limites.Jean… pedindo desculpas para mim?Fiquei surpresa. Levantei a cabeça às pressas e balbuciei:— Não, não, não foi culpa sua. Você
Aquela aura imponente e inquestionável de Jean fez com que minha mão, escondida debaixo da mesa, se retraísse automaticamente.— Não foi nada sério, só me machuquei fechando a porta ontem à noite. — Ainda tentei disfarçar, forçando um sorriso tranquilizador.Mas ele não se convenceu. Sem dizer nada, ele levantou-se, contornou a pequena mesa quadrada entre nós e sentou-se ao meu lado.Fiquei tão surpresa que instintivamente me movi para o lado, tentando manter alguma distância, mas foi inútil. Jean simplesmente segurou minha mão e a puxou para examinar. Ao ver os hematomas, ele franziu o cenho, e o brilho em seus olhos escureceu.— E a outra mão? — Ele perguntou, olhando diretamente para mim.Engoli em seco. Não tinha como evitar. Relutante, estendi a outra mão. Ele a segurou, e, no instante em que nossas peles se tocaram, meu coração começou a bater descompassadamente.— Fechar uma porta pode machucar as duas mãos ao mesmo tempo? — Jean perguntou, sua voz baixa e carregada de desconfia