Eu simplesmente não conseguia entender, mas, aos poucos, comecei a perceber que a aproximação da família Auth parecia ter sido meticulosamente planejada.Desde a aparição de Jean no meu casamento, passando pelo convite da Sra. Auth para eu ir até a casa dela tirar medidas, até o momento em que Jean gastou trezentos milhões para comprar o Bracelete de Jade por mim. Nada disso parecia ser apenas fruto da bondade e generosidade deles. Tudo parecia calculado.Mas por quê? Por que fariam tudo isso por mim? Eu, uma herdeira rejeitada, sem relevância, abandonada pelo marido logo após o casamento. Mesmo que eu tivesse certa beleza e talento como estilista, isso não seria motivo suficiente para atrair a atenção e o esforço de uma família tão poderosa como a deles, muito menos para justificar essa importância absurda que pareciam dar a mim.Minha mente ficou presa em um turbilhão de dúvidas. Quanto mais eu pensava, mais tinha a sensação de que algo estava fora do lugar.Enquanto isso, Carlos seg
“Será possível que alguém da família Auth também tinha sangue raro, como o meu, e esteja tentando me manter por perto como um “banco de sangue” permanente?” Desde pequena, por causa do ambiente hostil em que cresci, aprendi a enxergar a verdadeira face das pessoas e a desconfiar das intenções alheias.Se até mesmo os meus próprios parentes foram tão cruéis e calculistas, por que alguém que não tem nenhum laço de sangue comigo seria tão bom e generoso? E eu, ingênua, achava que era apenas sorte, que tinha encontrado um “anjo protetor”.Lembrei-me do almoço de alguns dias atrás, no Condomínio Florensa, quando a Sra. Auth soltou aqueles comentários enigmáticos e cheios de segundas intenções. Isso só reforçou minha convicção de que a aproximação da família Auth não era nada inocente.Além disso, não foi o próprio Davi que, certa vez, disse que a família Auth era “um mar profundo” e que eu não tinha chance contra Jean? Será que ele sabia de algo que eu ainda não entendia completamente?Quan
Mas Jean recusou:— Não precisa ter pressa. Se você não pode amanhã, marcamos em outro momento.— Mas acho que não vou ter tempo nos próximos dias... Se minha irmã falecer, vou ter que lidar com muitas coisas por um bom tempo. Para não atrasar o seu lado, é melhor que minha assistente vá até você para resolver isso.Falei com toda a educação e sinceridade possíveis, acreditando que isso não o incomodaria. Mas Jean não era ingênuo. Ele percebeu algo estranho nas entrelinhas e foi direto ao ponto:— Kiara, por que você está tão formal e distante de repente? Agora usa formalidades, evita me encontrar... Aconteceu algo? Eu ou minha família fizemos algo que te desagradou?Suas palavras diretas me deixaram sem reação. Minha língua parecia travada, incapaz de formar uma resposta convincente.Jean, no entanto, manteve a calma, falando com paciência:— Se fizemos algo errado, você pode me dizer. Não tem problema.— Não, não... De jeito nenhum. Pelo contrário, vocês foram bons demais comigo, e é
Embora isso estivesse dentro das minhas expectativas e fosse exatamente o resultado que eu queria, ainda assim meu coração apertava. A imagem de Jean flutuava na minha mente. Apesar de termos nos conhecido há pouco tempo, cada expressão, cada sorriso e cada movimento elegante dele permaneciam claros como o dia na minha memória.Passei um bom tempo imersa nessa melancolia, mas, ao perceber que já era tarde, sacudi a tristeza e comecei a me preparar. Era hora de ir ao hospital. O confronto com a família Mendes prometia ser mais uma batalha dura, e eu não tinha nem forças nem tempo para me perder em devaneios românticos. Restava deixar que o tempo apagasse essas lembranças aos poucos.Quando cheguei ao hospital, vi que Carlos e Isabela já tinham sido liberados. Não era difícil imaginar que isso era obra de Davi.A situação de Clara, como haviam dito, era realmente crítica. Ela estava na UTI, cercada por uma infinidade de aparelhos. Tubos a envolviam por todos os lados, e ela usava uma más
Davi provavelmente já sabia há muito tempo quem Clara realmente era. Mas, como já havia feito sua escolha errada, preferia insistir nela a admitir o erro e perder a compostura. Agora, com Clara admitindo tudo abertamente, sem sequer se dar ao trabalho de fingir, era como se ela o humilhasse na frente de todos. Como ele poderia não se sentir constrangido? Como poderia manter a aparência?Clara, à beira da morte e ciente de que seus dias estavam contados, parecia ter perdido qualquer vergonha. Ela estendeu a mão magra e, com uma voz arrogante, ordenou:— Passe o bracelete. Você já assinou os papéis para recuperar as ações. Vai querer voltar atrás agora?Eu segurei o bracelete com firmeza, sem dizer nada, apenas olhando para ela com um olhar frio e impassível.Vendo que eu não respondia, Clara virou a cabeça para Davi e, com a voz fraca e cheia de afetação, pediu:— Davi… pega o bracelete para mim. Me ajuda a colocar.Ela ergueu com dificuldade a mão que não estava conectada ao soro, este
Clara estava muito emocionada. Mal havia terminado a frase, começou a tossir violentamente. Os aparelhos ao lado da cama emitiram sons de alerta, e Davi imediatamente se aproximou para ajudá-la, dando leves tapinhas em suas costas para aliviar a respiração.— Clara, você está fraca. Não fale mais nada. — Pediu ele, preocupado.— Não se meta comigo! — Clara afastou Davi com um movimento brusco e levantou o olhar para mim, um sorriso fraco mas cheio de sarcasmo surgindo em seus lábios. — Kiara… Você e sua mãe sempre fizeram o mal. Agora estão pagando por isso. Veja sua mãe… tão jovem e já...Ela não conseguiu terminar a frase. Outra crise de tosse violenta a interrompeu, e parecia que ela não conseguiria se recuperar tão cedo.O rosto de Davi ficou sombrio. Ele se aproximou novamente, dando leves tapinhas em suas costas para ajudá-la a respirar, mas sua paciência parecia estar no limite.— Clara, já falei para você parar com isso! Pense na sua saúde! Você já conseguiu tudo o que queria.
Clara chorava descontroladamente. De repente, como se tivesse tomado uma decisão, soltou a mão de Davi e arrancou o bracelete do pulso com um movimento brusco.— Davi, eu não vou mais disputar nada com ela, não quero mais nada! Nem mesmo esse bracelete! Eu só quero você, só quero que fique ao meu lado... — Declarou Clara, com a voz embargada.Antes mesmo de terminar a frase, ela levantou o bracelete que acabara de tirar e o arremessou com força aos meus pés. Todos no quarto ficaram paralisados, chocados com o que acabara de acontecer. Meu rosto endureceu, mas meu corpo reagiu no instinto e me abaixei rapidamente para tentar agarrá-lo no ar. Porém, era tarde demais.O bracelete atingiu o chão com um som seco, partindo-se em pedaços.— Clara! — Davi rugiu, sua voz reverberando pelo quarto.Ainda agachada, fiquei olhando para os pedaços espalhados pelo chão, como se o tempo tivesse congelado. Meu corpo permanecia imóvel, quase como se estivesse preso em uma camada de gelo.Clara, por sua
Davi mantinha o rosto inexpressivo, como se tudo aquilo não tivesse nada a ver com ele. Nem sequer olhou para Clara, permanecendo imóvel, indiferente.— Davi! Você ficou surdo? — Clara finalmente explodiu. Pegou o que estava ao alcance no criado-mudo e atirou contra ele.— Clara, calma, minha filha! — Isabela correu para tentar contê-la, assustada ao ver que a filha havia arrancado a agulha do soro no calor do desespero.Davi desviou os objetos que vinham em sua direção, movendo-se tranquilamente. Só então, decidiu responder, ainda com o mesmo tom frio e distante:— Se você quer tanto assim, vá pegar você mesma. Eu tenho coisas para fazer. Já vou embora.E foi exatamente o que ele fez. Davi virou-se e saiu sem olhar para trás. Sua determinação era impressionante. Quando ele decidia algo, não deixava espaço para dúvidas ou arrependimentos. Um mês atrás, ele havia tomado a decisão de me abandonar para se casar com Clara. Na época, suportou toda a pressão que veio com isso, me deixando se
Por educação, mesmo não suportando essa família, mantive um sorriso cordial e cumprimentei:— Boa noite, Sra. Eduarda. — Kiara, você está mesmo com o Sr. Jean? Ele sabe que você já foi casada? Que você é... uma mulher divorciada? Isso não é algo que... — Disse Eduarda. — Mãe, divorciada nada! Ela nem terminou o casamento com o meu irmão ainda. Se está com o Sr. Jean agora, então é traição! — Tânia interrompeu, cruzando os braços e franzindo a testa, com uma expressão de desprezo e indignação. Depois, murmurou, como se reclamasse sozinha. — O que deu no Sr. Jean para se interessar por ela? Fora ser bonita, não sei o que mais ela tem de especial. Eu nem precisei abrir a boca e já estava sendo acusada de traição. Era quase cômico, se não fosse tão irritante.— Tânia, o cérebro é uma coisa maravilhosa, pena que você não tem. Quer que a gente pergunte para qualquer pessoa aqui quem traiu quem no meu casamento com seu irmão? — Falei, sem perder o tom calmo, mas com um sorriso cortante.
Mas, na frente de Pablo, não era o momento certo para perguntar nada. Eu só podia esperar por outra oportunidade. Percebendo o meu evidente constrangimento, Jean, sempre atento, tratou de me tirar daquela situação: — Vamos? Os convidados já estão quase todos aqui, e a festa está prestes a começar. Segui Jean até o salão de festas e, mais uma vez, fiquei impressionada com o que vi. Dentro do Condomínio Florensa, havia um prédio independente de três andares, com um grande salão de eventos, salas de reunião multifuncionais e até um clube privativo. A construção ficava separada da mansão principal, garantindo total privacidade aos anfitriões. A decoração era sofisticada e discreta, mas de extremo bom gosto. Cada peça parecia um item de coleção, digna de um museu de arte. O salão estava lotado, um verdadeiro mar de gente. Os convidados conversavam animados, trocando risadas e comentários em tons elegantes. Bastou um olhar rápido para reconhecer algumas figuras que eu já havia vi
— E como você pretende explicar?— Vou dizer que não tem nada entre nós, que eu não dormi com você e que você também não dormiu comigo.— Uma moça ir explicar algo assim? Isso só vai me fazer parecer ainda mais… sem moral. — Isso… — Eu estava à beira de um colapso, coberta de vergonha. — Então o que a gente faz? Enquanto tentávamos encontrar uma solução, uma voz inesperada nos interrompeu: — Jean, disseram que você saiu pessoalmente para buscar um convidado especial. Qual foi a herdeira tão importante que mereceu esse esforço todo? Olhei na direção da voz e vi um homem alto e imponente se aproximando, com uma postura confiante e um sorriso fácil no rosto. Jean nem precisou se virar para saber quem era. Sua expressão ficou ainda mais sutil, quase resignada. — Falando no diabo… — Murmurou ele. Meus olhos se arregalaram. O quê? Esse é o Pablo? Eu não o conhecia pessoalmente. Afinal, a família Braga, sendo tão prestigiada quanto a família Auth, estava em um patamar completame
— Não, não, de jeito nenhum! — Balancei as mãos no ar, tentando encerrar o assunto enquanto apressava os passos. Mas, mesmo assim, não resisti e olhei de canto para Jean algumas vezes. Por dentro, eu só conseguia rezar para que aquela Bentley naquela noite não tivesse sido dirigida por Pablo. Pena que minhas preces não foram atendidas. Jean notou minha expressão estranha, hesitante, e após uma breve pausa perguntou: — Você viu o Pablo recentemente? Quando ele disse isso, tudo ficou claro para mim. Meu único desejo era desaparecer naquele instante e nunca mais ser encontrada. — Então... o Pablo mencionou alguma coisa para você? — Perguntei, já aceitando meu destino, decidindo jogar limpo. Jean apertou os lábios, e por um segundo sua expressão impecável e aristocrática foi tomada por algo que parecia... uma mistura de constrangimento e diversão. — Você está se referindo àquela discussão com o Davi... quando você disse que tinha dormido comigo? E não apenas uma vez, mas vári
Dei algumas voltas na frente do espelho, analisando cada detalhe, e fiquei satisfeita com o que vi. Foi quando o som do meu celular quebrou o silêncio. Olhei para a tela e vi o nome de Jean. — Alô, Sr. Jean. — Kiara, em cerca de dez minutos o motorista estará na frente do seu prédio. — Tudo bem, estou pronta. Vou descer assim que ele chegar. — Respondi animada, mas logo acrescentei, um pouco constrangida. — Desculpe pelo incômodo, você realmente não precisava se preocupar em mandar alguém para me buscar. — Não há problema. Viajar à noite de carro pode ser perigoso. Se eu a convidei, é minha responsabilidade garantir a sua segurança. Ele era sempre assim: atencioso, impecável, sem deixar nenhum detalhe passar. Depois que desliguei, guardei o celular na bolsa e adicionei um último retoque: coloquei dentro o batom e o pó compacto, só para garantir. Fiz uma última checagem no espelho e saí de casa. O caminho até a entrada do prédio foi acompanhado por um misto de excitação e an
Eu finalmente entendi. Não era à toa que Davi parecia tão abatido e com o rosto pálido. — Kiara, por favor, ajude a Clara. Tudo o que aconteceu no passado foi culpa nossa. Se você quiser, eu peço desculpas. Está bem assim? Só te peço que tenha piedade e vá até o hospital para ajudá-la... — Disse Isabela, quase implorando. De repente, ela avançou e agarrou minha mão. O movimento brusco assustou Higger, que deu um pulo e se escondeu atrás de mim. Franzi ainda mais a testa, olhando para Isabela enquanto sentia um sorriso frio surgir dentro de mim.— Que surpresa... Nunca imaginei que ouviria um pedido de desculpas vindo de você. — Não consegui conter o tom sarcástico. — Eu estou me desculpando, Kiara. Eu faço o que você quiser, o que for necessário, mas por favor, salve a Clara. Ela é sua irmã, afinal de contas. É uma vida humana! — As lágrimas começaram a escorrer pelo rosto de Isabela, e, pela primeira vez, ela parecia sinceramente desesperada. Como mãe, ela estava sendo exemp
Eu não esperava que Jean soubesse disso. A situação ficou ainda mais constrangedora, especialmente ao lembrar que eu havia mentido para Davi, dizendo que tinha dormido com Jean... várias vezes. A vergonha me fez gaguejar antes de conseguir falar: — Então... ele não concordou com o acordo de divórcio, por isso eu precisei entrar com uma ação no tribunal. A audiência está marcada para o dia 6 do próximo mês. — Evitei olhar para Jean diretamente, lançando um olhar rápido e desviando logo em seguida, enquanto explicava. — Dia 6 do próximo mês? Ainda faltam mais de duas semanas. — Sim, foi a data que o tribunal determinou, não há muito o que fazer. — Entendi. Não se preocupe. — Jean disse num tom reconfortante, mas logo acrescentou, após uma breve pausa. — Mas, normalmente, na primeira audiência de divórcio, o tribunal tenta uma conciliação. Se não der certo, só depois de seis meses você pode entrar com um novo pedido. E aí, geralmente, o divórcio é concedido. — Sim, meu advogad
Eu não conseguia encontrar palavras para descrever o que sentia naquele momento. A vergonha me consumia de tal forma que eu não conseguia sequer olhar para ele. Era como se meu orgulho tivesse sido completamente esmagado.Jean, percebendo meu desconforto e o quanto eu queria desaparecer dali, foi extremamente gentil e disse, com um tom tranquilizador:— De vez em quando, é bom se divertir com os amigos, ajuda a aliviar o estresse e deixar os problemas de lado. Além disso, ninguém além de mim viu o que aconteceu naquela noite. Pode ficar tranquila, eu guardo esse segredo.A última frase dele veio carregada de um humor leve, mas seus olhos brilhavam com algo mais... uma leve insinuação, talvez? Meu rosto ficou paralisado em um misto de surpresa e constrangimento. Segundos depois, senti o calor subindo para minhas bochechas, que pareciam estar em chamas. Meu coração começou a bater rápido, e minha cabeça, como sempre, decidiu imaginar coisas.O meu sexto sentido me dizia que havia algo d
O quê? Meu rosto ainda estava... se partindo. Eu mal conseguia processar a situação. Vomitar era a coisa mais nojenta do mundo, o cheiro era insuportável. E pensar que um herdeiro de uma família tão rica e poderosa cuidou disso para mim, limpando algo tão repugnante? Não era de se estranhar que, quando acordei no dia seguinte, o lixo já estivesse impecavelmente limpo. Ele mesmo deve ter tratado de tudo naquela noite.— Quando cheguei em casa, percebi isso, mas... não tive coragem de te ligar. Hoje trouxe para você pessoalmente. — Jean continuou falando, aparentemente alheio ao meu evidente desconforto.Essas palavras cutucaram uma parte sensível da minha mente, despertando minha curiosidade. Olhei para ele, ainda confusa, e perguntei, hesitante:— Você... não teve coragem de me ligar?Jean deu um sorriso discreto, e seus olhos brilhavam como se guardassem um universo inteiro. Por um momento, ele parecia até um pouco envergonhado:— Sim. Tive medo de que você, ao ver o relógio, pensasse