Eu mal tinha conseguido me firmar no chão quando ouvi, às minhas costas, aquela voz suave e firme, que parecia sempre encontrar uma brecha para me desarmar:— Kiara...Meu coração disparou, e os pelos da nuca se arrepiaram. Virei-me rapidamente:— Hã?Jean ainda estava no carro, ligeiramente inclinado em minha direção. Seus olhos, brilhantes como estrelas numa noite calma, traziam um calor inesperado, enquanto um sorriso discreto suavizava sua expressão séria:— Não se preocupe, estou muito bem de saúde. Obrigado pela preocupação.Seu tom era tão sincero que, sem querer, meus nervos tensos relaxaram de imediato. Acabei sorrindo suavemente:— Que bom.— Até mais. — Ele fez um leve gesto com a mão.— Até mais. — Respondi, retribuindo o gesto.Minha intenção inicial era fugir dali o mais rápido possível, mas a sua resposta gentil, carregada de uma tranquilidade que parecia me envolver, me fez mudar de ideia. Eu permaneci parada na calçada, observando o carro dele partir. Por algum motivo,
Assim que entrei no carro, peguei o celular e liguei diretamente para Carlos. Na primeira vez, ele não atendeu. Tentei novamente. Nada. Só na terceira tentativa ele finalmente atendeu, e sua voz veio carregada de irritação:— O que foi? Estou ocupado!— Ocupado com o quê? Não me diga que você também foi levado pela Receita para prestar depoimento? — Fui direto ao ponto, sem rodeios.Do outro lado, ele ficou em silêncio por um instante, como se estivesse surpreso, mas logo tentou disfarçar:— Do que você está falando?Eu soltei uma risada fria. Não acreditava nem por um segundo que ele não soubesse sobre o que tinha acontecido comigo naquela manhã:— Carlos, você me jogou no meio de uma armadilha. Agora vai ter que acertar as contas comigo.— Que absurdo! Desde quando uma filha se refere ao próprio pai pelo nome? — Ele tentou usar o tom autoritário de sempre, mas dessa vez eu não estava disposta a ceder.— Pai? Você acha que merece esse título? Até chamar você de animal seria um insulto
— Não vou embora! Quero ver ela no chão, acabada, humilhada! Antes, por causa da Clara, eu me ajoelhei para pedir ajuda a ela, e ela nem sequer piscou! Hoje, quero que ela se ajoelhe e bata a cabeça no chão pedindo perdão, ou vou mandá-la direto para a cadeia! — Isabela gritou, com a voz cheia de ódio.De repente, a porta foi escancarada com um estrondo. Eu entrei rindo friamente e disse em alto e bom som:— Ajoelhar e bater a cabeça no chão? Isso é coisa de ritual para os mortos. Você decidiu morrer hoje, madrasta? Vai fazer companhia para sua filha querida no além?A porta bateu na parede com força, ecoando pelo escritório, e os dois se viraram assustados. Quando me viram, a expressão de Isabela mudou do medo para uma raiva grotesca:— Kiara! Quem você pensa que está amaldiçoando?!— Quem me mandar ajoelhar, eu amaldiçoo.— Sua...! — Isabela ficou tão furiosa que não conseguiu terminar a frase. Avançou em minha direção, levantando a mão para me dar um tapa.Antes que ela conseguisse,
Eu assenti, peguei os documentos de volta e me virei para a multidão:— Certo, pessoal, vamos nos acalmar. — Levantei a voz para interromper a confusão, caminhando até o centro da sala com os papéis em mãos. — Meu querido pai, você não queria provas? Aqui estão elas.Carlos, que tinha acabado de sair de uma discussão acalorada e estava vermelho de raiva, olhou para os documentos na minha mão. Sem sequer tentar ler, avançou rapidamente e os arrancou de mim.Não resisti, deixei que ele pegasse.Ele, tomado pela fúria, rasgou tudo no mesmo instante, os pedaços voando pelo chão enquanto ele esbravejava:— Não sei o que é isso, mas tenho a consciência limpa!Dei de ombros, impassível:— Sem problema. Eu tenho outras cópias. Pode continuar rasgando. Quando se cansar, conversamos sobre como resolver isso.Peguei outra cópia das mãos de Hana e a entreguei diretamente a ele.Carlos me encarou com olhos cheios de ódio, enquanto os músculos de seu rosto tremiam de raiva:— Kiara! Você é cruel! So
Levantei-me, apontando para Carlos, aquele arrogante que se achava intocável:— Policial, boa tarde. Fui eu quem chamou. Meu nome é Kiara, e venho denunciar formalmente esse homem Carlos, pelos crimes de fraude contratual, sonegação fiscal e lavagem de dinheiro. Aqui estão algumas das provas... E, senhores da Receita Federal, sobre o caso de sonegação envolvendo a LongVoyage Comércio Ltda., que vocês estão investigando, Carlos é o verdadeiro responsável. Tenho provas suficientes para demonstrar que ele agiu de má-fé, tentando enganar e fugir das responsabilidades. Por favor, investiguem com atenção.Antes de vir, trouxe comigo o acordo de transferência de ações que assinei recentemente, além das evidências financeiras fornecidas pela Hana. Entreguei todos os documentos tanto à polícia quanto aos fiscais. Essas provas eram mais que suficientes para demonstrar que me tornei sócia majoritária da empresa há pouco tempo e que não tinha conhecimento nem envolvimento com as irregularidades an
O policial, sem paciência para continuar ouvindo Carlos, virou-se para mim e perguntou:— Srta. Kiara, poderia nos acompanhar até a delegacia? De acordo com o protocolo, precisamos registrar seu depoimento.— Claro. — Respondi.Afinal, fui eu quem fez a denúncia. Era minha obrigação colaborar com a investigação.Carlos foi levado algemado. Os funcionários de sua nova empresa assistiram à cena sem saber o que dizer, completamente atônitos. Pobres coitados... Mal haviam começado a trabalhar e já teriam que procurar outro emprego, porque a empresa estava fadada a fechar as portas.Fui até a delegacia com os policiais e, após colaborar com todo o procedimento e terminar o depoimento, já era sete da noite. Quando saí, olhei para as luzes da cidade que brilhavam por toda parte e senti uma saudade profunda da minha avó. Resolvi então dirigir até a casa dela para jantar.Contei-lhe toda a história, desde o início até o desfecho. Ela ficou visivelmente contente:— Finalmente eles estão pagando
Cheguei ao estacionamento, abri a porta do carro e me sentei. Depois de colocar o celular no suporte com o viva-voz ativado, virei-me para colocar o cinto de segurança.— Denunciei meu próprio pai. Ele com certeza vai para a cadeia. Vim contar isso para a minha mãe, para que ela possa ficar feliz lá no outro mundo. — Falei, sem o menor peso na consciência.Jean riu levemente do outro lado da linha:— Você é rápida mesmo.Meu tom de voz era puro alívio e satisfação:— Claro, né? Se eu não fosse, ia acabar pagando o pato por ele. Gastar dinheiro ainda vai, mas correr o risco de ir parar na prisão? Nem pensar!— Direta e eficiente. Estou impressionado de novo.— Obrigada pelo elogio, Mestre Jean. — Brinquei, ligando o carro. Depois voltei ao assunto. — Mas e aí, por que você me ligou?— Nada demais. Só queria saber se o ferimento no seu braço já melhorou.Ao ouvir isso, foi que me lembrei do corte no meu braço direito. Eu estava tão ocupada que tinha esquecido completamente. Levantei o br
De qualquer forma, eu mesma me convenci:“Somos apenas amigos. Amigos que, de vez em quando, se encontram para almoçar. Nada mais normal do que isso.”Meia hora depois, cheguei ao Bom Sabor. O gerente do restaurante me reconheceu e, assim que me viu, disse:— Srta. Kiara, seu convidado já chegou. Está na sala privativa número um.— Ah, obrigada.Meu coração deu um salto, e, enquanto caminhava, acabei acelerando o passo, quase correndo.O garçom abriu a porta da sala para mim, e meu rosto já trazia um sorriso iluminado:— Sr. Jean…Mal terminei de falar, vi uma garota sentada ao lado dele. Meu rosto passou de surpresa a alegria em questão de segundos:— Ué? Amélia, você também veio?Amélia sorriu docemente:— Ué, não posso vir? Vai me dizer que tô atrapalhando o momento de vocês dois?Minhas bochechas ficaram quentes. Automaticamente, olhei para Jean, nervosa e sem saber onde enfiar a cara:— Claro que eu queria que você viesse.Quanto ao comentário sobre "o momento de vocês dois", fing
— Meu irmão já está assim, e você ainda vem pressioná-lo. Você não tem um pingo de humanidade? — Tânia gritou, furiosa.— O estado do seu irmão não é culpa minha. Então, por favor, pare com esse discurso moralista. — Eu respondi, pegando de volta o acordo de divórcio, que ela havia tomado de mim, e dei dois passos à frente para colocá-lo sobre o criado-mudo ao lado da cama. — Davi, vou repetir: eu salvei sua vida, fui além do que qualquer pessoa faria. Foi você quem me traiu primeiro, então não me culpe por estar sendo fria agora. Assine logo o acordo de divórcio e, pelo menos uma vez, faça o que é certo.Davi me encarou fixamente. Quando terminei de falar, ele levantou a mão devagar e pegou o documento.Eu pensei que ele fosse rasgá-lo e avisei:— Eu trouxe várias cópias. Rasgar essa não vai adiantar nada.Mas, para minha surpresa, ele deu uma olhada no acordo, girou o papel levemente na minha direção e disse apenas uma palavra:— Caneta.Eu fiquei paralisada por um instante, sem ente
Eu já tinha até organizado um "grupo de apoio", e ele me vem com essa de fugir na última hora. Agora, eu precisava avisar as tias e senhoras que fazem parte do grupo para não irem ao tribunal amanhã. Quanto ao próximo passo, iria avisá-las no momento certo.Essas mulheres, todas empolgadas com o desconto vitalício de 60% nos produtos da minha marca, estavam sempre de prontidão e dispostas a ajudar.Ficar parada nunca foi meu estilo. Depois de pensar durante boa parte da noite, decidi que no dia seguinte eu iria visitar o canalha.Eu imaginei que, se ele estava doente, provavelmente teria procurado o médico que sempre o acompanhava. Quando cheguei ao hospital, acertei: ele estava lá.Eduarda e Tânia também estavam no local. Quando elas me viram, ficaram claramente surpresas.Tânia foi a primeira a se manifestar, com o tom irritado de sempre:— O que você veio fazer aqui? Meu irmão já pediu o adiamento da audiência. Agora vai persegui-lo no hospital e arrastá-lo à força para o tribunal?
Além disso, será que Jean já percebeu que eu também estou interessada nele? Esse assunto não podia continuar. Se deixássemos as coisas claras demais, talvez nem como amigos conseguíssemos continuar.Depois de um breve silêncio, mudei de assunto:— A propósito, a Bela mencionou um jantar. Que dia você está livre?— No fim de semana, se você tiver tempo. — Respondeu Amélia.— Certo, eu organizo.Quando chegamos na empresa, eu liguei o computador e mostrei para ela uma série completa de croquis de vestidos de gala, dizendo que ela podia escolher à vontade.Amélia ficou surpresa:— Como você conseguiu criar tantos?— Esses são os esboços que estou preparando para a Semana de Moda de Milão, em fevereiro do ano que vem. Assim que terminar os compromissos atuais, vou focar totalmente nisso. — expliquei.— Uau... São incríveis! — Amélia exclamou, admirada, e depois acrescentou, visivelmente emocionada. — Isso deve ser confidencial, não? E você está me mostrando tudo assim? Você confia mesmo em
Bela sorriu e disse:— Da próxima vez que vierem, eu pago. Peçam o que quiserem.Depois, Bela olhou para mim e lembrou:— Kiara, organize seu tempo e me avise quando marcar.— Sério? — Perguntei, um pouco surpresa.— Claro! Essa refeição de hoje já deveria ter sido por minha conta, mas cheguei de viagem e vocês já tinham terminado.Enquanto ainda conversávamos, o secretário de Jean, Leonardo, aproximou-se apressado:— Sr. Jean, o carro chegou.Bela entendeu a situação imediatamente e disse:— Então está combinado. Sei que todos estão ocupados, não vou segurar vocês.— Certo, até mais, Bela. — Amélia acenou para ela enquanto saíamos juntos.Jean estava com pressa, e seu carro já o aguardava na entrada do restaurante. Leonardo abriu a porta traseira com antecedência, e Jean entrou no veículo com elegância:— Eu vou indo. Divirtam-se.— Tchau! — Eu observei através da janela abaixada aquele rosto impecavelmente bonito e tentei conter a emoção que me invadia.O Audi A8 partiu devagar, e Am
Eu olhei para o lenço dele, hesitei um pouco e então o peguei:— Obrigada.Ao lembrar que ainda havia outro lenço dele comigo, apertei este entre os dedos, sentindo meu coração disparar mais uma vez. Depois de enxugar os cantos dos olhos e me acalmar, segurei o lenço com certa vergonha:— Hum... Eu lavo e depois devolvo...— Não precisa, me dá aqui. — Antes que eu terminasse a frase, Jean me interrompeu e estendeu a mão para pegar o lenço de volta.Minhas bochechas queimaram de vergonha. Baixei a cabeça e foquei em comer o que estava no prato. Depois de terminar, chamei o garçom para pedir a conta, mas ele me informou:— Srta. Kiara, a conta já foi paga.— Já foi paga? Por quem? — Perguntei, surpresa.Antes que o garçom pudesse responder, Amélia disse com leveza:— Meu irmão já pagou, vamos!Eles se levantaram, e eu os segui, mas extremamente sem graça:— Sr. Jean, havíamos combinado que seria eu a pagar, para agradecer pela ajuda que você me deu outro dia. Por que você pagou de novo?
Eu admirava Jean do fundo do coração. Respeitava-o, apreciava-o, e desejava sinceramente que ele fosse cada vez melhor. Não queria que nada estragasse isso, que ninguém manchasse a sua imagem nem mesmo eu. Por isso, preferia não dizer nada, deixar as coisas como estavam, nesse limbo de ambiguidade, e me consolar com a ideia:"Nós somos apenas amigos."— E aí, conseguiu resolver os problemas da sua família? — Enquanto eu me perdia nesses pensamentos, Jean e Amélia já haviam começado a comer, conversando casualmente e demonstrando preocupação comigo.Assenti com a cabeça:— Digamos que sim. Meu pai foi preso, as provas contra ele são incontestáveis. Consultei um advogado e é certo que ele terá que responder pelos crimes. Agora, só falta saber quantos anos de condenação ele vai pegar. Mas, de qualquer forma, voltar à miséria é inevitável.Por dentro, eu pensava:“Se o fisco decidir pesar a mão, talvez ele ainda saia dessa com dívidas. E aí, recomeçar seria impossível.”Jean me ouviu com a
De qualquer forma, eu mesma me convenci:“Somos apenas amigos. Amigos que, de vez em quando, se encontram para almoçar. Nada mais normal do que isso.”Meia hora depois, cheguei ao Bom Sabor. O gerente do restaurante me reconheceu e, assim que me viu, disse:— Srta. Kiara, seu convidado já chegou. Está na sala privativa número um.— Ah, obrigada.Meu coração deu um salto, e, enquanto caminhava, acabei acelerando o passo, quase correndo.O garçom abriu a porta da sala para mim, e meu rosto já trazia um sorriso iluminado:— Sr. Jean…Mal terminei de falar, vi uma garota sentada ao lado dele. Meu rosto passou de surpresa a alegria em questão de segundos:— Ué? Amélia, você também veio?Amélia sorriu docemente:— Ué, não posso vir? Vai me dizer que tô atrapalhando o momento de vocês dois?Minhas bochechas ficaram quentes. Automaticamente, olhei para Jean, nervosa e sem saber onde enfiar a cara:— Claro que eu queria que você viesse.Quanto ao comentário sobre "o momento de vocês dois", fing
Cheguei ao estacionamento, abri a porta do carro e me sentei. Depois de colocar o celular no suporte com o viva-voz ativado, virei-me para colocar o cinto de segurança.— Denunciei meu próprio pai. Ele com certeza vai para a cadeia. Vim contar isso para a minha mãe, para que ela possa ficar feliz lá no outro mundo. — Falei, sem o menor peso na consciência.Jean riu levemente do outro lado da linha:— Você é rápida mesmo.Meu tom de voz era puro alívio e satisfação:— Claro, né? Se eu não fosse, ia acabar pagando o pato por ele. Gastar dinheiro ainda vai, mas correr o risco de ir parar na prisão? Nem pensar!— Direta e eficiente. Estou impressionado de novo.— Obrigada pelo elogio, Mestre Jean. — Brinquei, ligando o carro. Depois voltei ao assunto. — Mas e aí, por que você me ligou?— Nada demais. Só queria saber se o ferimento no seu braço já melhorou.Ao ouvir isso, foi que me lembrei do corte no meu braço direito. Eu estava tão ocupada que tinha esquecido completamente. Levantei o br
O policial, sem paciência para continuar ouvindo Carlos, virou-se para mim e perguntou:— Srta. Kiara, poderia nos acompanhar até a delegacia? De acordo com o protocolo, precisamos registrar seu depoimento.— Claro. — Respondi.Afinal, fui eu quem fez a denúncia. Era minha obrigação colaborar com a investigação.Carlos foi levado algemado. Os funcionários de sua nova empresa assistiram à cena sem saber o que dizer, completamente atônitos. Pobres coitados... Mal haviam começado a trabalhar e já teriam que procurar outro emprego, porque a empresa estava fadada a fechar as portas.Fui até a delegacia com os policiais e, após colaborar com todo o procedimento e terminar o depoimento, já era sete da noite. Quando saí, olhei para as luzes da cidade que brilhavam por toda parte e senti uma saudade profunda da minha avó. Resolvi então dirigir até a casa dela para jantar.Contei-lhe toda a história, desde o início até o desfecho. Ela ficou visivelmente contente:— Finalmente eles estão pagando