— Como fui dar à luz uma criatura tão cruel e sem coração como você?! — A vovó estava tão indignada que mal conseguia respirar. — Passei dois meses fora do país sem nenhuma notícia dela! Fiquei preocupada todos os dias, e agora que voltei, ainda não consigo falar com ela! Com certeza foram vocês que fizeram ela sofrer!A voz dela tremeu de raiva.— Ela não mora com vocês? Manda ela atender o celular agora!A mãe ficou em silêncio por um instante e trocou um olhar com o pai.Dois meses atrás, Joel teve um capricho de acampar na área proibida do Vale do Eclipse.Eu sabia dos riscos, mas, no fundo, queria aproveitar essa oportunidade para me aproximar da família. Até tirei folga no trabalho para ir.Nunca imaginei que Elisabete cairia na água.E menos ainda, que ao ser resgatada, apontaria para mim e diria que eu a empurrei.A mãe não quis ouvir explicações. Completamente cega de raiva, me deu vários tapas no rosto e me abandonou na floresta.O que eles não sabiam... é que naquele dia, eu
O apresentador do noticiário alertava a população para evitar a área do Vale do Eclipse e prevenir mais tragédias.Joel se endireitou no sofá.— O Vale do Eclipse foi interditado?!A mãe franziu o cenho no mesmo instante, como se algo lhe ocorresse.Já Joel, ao contrário, saltou do sofá e bateu as mãos nas pernas, animado.— Isso é ótimo! Então a nossa viagem de acampamento foi a última antes do fechamento! Meus amigos vão morrer de inveja, nenhum deles teve essa chance!A tensão no rosto da mãe diminuiu um pouco.— Para de fazer esse escândalo. Já escolheu o presente da sua avó?O pai, que até então também estava sombrio, relaxou um pouco.— Esse ano, você e a Bete precisam se esforçar pra agradar a sua avó.Joel bufou, desinteressado.— Ah, relaxa. Todo ano a Jesiane escolhia o presente pra mim, e a vovó sempre gostava. Não precisa se preocupar.Dito isso, voltou sua atenção para o jogo na TV.Ao ouvir meu nome, a mãe lançou um olhar de puro desprezo e se levantou, indo para o quarto
No dia seguinte, ainda não havia nenhuma notícia minha.De manhã cedo, minha avó apareceu.— Vovó!Feliz, flutuei em sua direção!Desde que morri, quis vê-la novamente, mas minha alma estava presa à minha mãe, incapaz de sair de perto dela.Mas agora, vovó estava aqui.Só de poder vê-la mais uma vez, já podia descansar em paz.Antes que eu pudesse me aproximar, Joel correu para abraçá-la, exclamando:— Vovó!Ao longo dos anos, ele sempre usou minha proximidade com ela para se aproximar também.Com o tempo, e com minha influência, vovó acabou aceitando esse “neto” sem laços de sangue.Ela não via motivos para tratá-lo com frieza.Segurou a mão de Joel com carinho e o fez sentar ao seu lado.— Já está tão grande e ainda faz esse escândalo? Onde está sua irmã?— Irmã! — Joel gritou.Na mesma hora, Elisabete correu até a sala.— Vovó! Que bom que a senhora veio!O olhar da vovó, que antes trazia uma ponta de expectativa, esfriou no mesmo instante.Respondeu apenas com um seco:— Ei.Sem um
No passado, a vovó não aprovou o casamento da minha mãe com meu pai, temendo que ela passasse dificuldades ao lado de um homem sem dinheiro.Revoltada, minha mãe passou a noite bebendo, sem imaginar que acabaria sendo violentada por um marginal e, pior ainda, engravidaria.Naquela época, ainda era jovem. Tinha opções melhores.Mas, para punir minha avó e fazê-la se sentir culpada, decidiu seguir com a gravidez.Quando completei três anos, um dia, ao olhar para mim, viu traços do meu pai no meu rosto e orreu para fazer um teste de DNA.O resultado confirmou: eu realmente era filha do meu pai, e não do agressor.Minha mãe ficou aliviada e, com isso, conseguiu reconquistar meu pai.Mas, para os dois, eu ainda era uma mancha na história de amor que eles tanto idealizavam.Sem pensar duas vezes, me deixaram com minha avó e partiram para longe, como se eu fosse um erro que precisavam esquecer.Naquela época, meu pai tinha acabado de se divorciar de sua primeira esposa.Joel já tinha dois ano
Assim que atendeu a ligação, minha mãe disparou, irritada:— Sua desgraçada, será que pode parar de envenenar sua avó contra mim?!Mas a voz do outro lado era masculina. Soava séria.— Alô, a senhora é parente de Jesiane?Minha mãe franziu a testa.— Quem é você? E por que está com o celular dela? — O tom era frio.— Encontramos os documentos e o telefone de Jesiane em um apartamento alugado. Precisamos que compareça à delegacia para confirmar algumas informações.Ao ouvir isso, sua expressão relaxou um pouco.— Sabia que aquela praga tinha se mudado. Só sabe arrumar confusão.Sem demonstrar qualquer preocupação, desligou o telefone e continuou comendo.Elisabete desviou o olhar, inquieta.— Mamãe… não era a Jesiane?— Ela perdeu o celular. A delegacia só quer que alguém vá buscar. Nada urgente. Terminamos de comer primeiro.Elisabete esboçou uma expressão de ansiedade.Falou mais rápido do que o normal:— Mamãe, posso ir? Jesiane é minha irmã, afinal.Minha mãe elogiou sua "maturidade
O aniversário de 60 anos da vovó foi uma celebração íntima, apenas para familiares e amigos próximos.No salão, minha mãe e meu pai varriam o local com os olhos, claramente à minha procura.Até Joel pareceu surpreso.— Jesiane não veio mesmo? Será que aconteceu alguma coisa com ela?Elisabete deu um tapa leve na mão dele.— Para de falar besteira! Ela já é adulta, não tem nada de errado.E só com isso, todos ficaram tranquilos novamente.Minha mãe suspirou.— Daqui a pouco, um monte de gente vai nos culpar por isso.Ao ouvir isso, não pude evitar um sorriso amargo.Então era isso.Achei que estivessem me esperando por preocupação…Mas, na verdade, era só medo da opinião alheia.Deixando esse assunto de lado, minha mãe se voltou para Elisabete.— Aproveite a ocasião e entregue seu presente para sua avó. Na frente de todo mundo, ela não vai te desmerecer.Os olhos de Elisabete brilharam de excitação.A vovó era uma empresária de grande prestígio na cidade, uma mulher rica e poderosa.Qua
Sala de interrogatório.Minha mãe abraçava Elisabete protetoramente.— Eu sou a responsável legal dela. Qualquer coisa, perguntem para mim. Bete é só uma menina, não precisa passar por esse tipo de situação.Elisabete se encolhia em seus braços, o corpo tremendo levemente.Parecia realmente frágil, assustada, indefesa.O policial assistiu à cena e soltou um riso frio.— Menina? Ela tem vinte e seis anos!Minha mãe ignorou o tom de deboche e acariciou as costas de Elisabete, tentando acalmá-la.— Eu entendo que estão apenas fazendo o trabalho de vocês, mas Bete não sabe de nada. Ela e Jesiane eram irmãs, mas cada uma levava sua vida.O policial foi direto ao ponto:— Ontem, realizamos uma operação em um apartamento alugado onde um grupo estava envolvido em jogos ilegais. Durante a busca, encontramos alguns pertences de Jesiane. Foi Elisabete quem foi buscar os itens, certo?Minha mãe hesitou por um momento.— Sim… O celular e os documentos dela foram entregues a vocês agora há pouco. Ma
Elisabete apertou as mãos com força, os dedos crispando no tecido da roupa.Mas nada podia impedir o policial de continuar:— O mais importante são algumas chamadas deletadas. O laudo forense confirmou que Jesiane foi enterrada viva. E essas ligações… foram seus pedidos de socorro. Mas você, ignorou todas elas.O rosto da minha mãe ficou completamente sem cor.— Não pode ser! Eu esperei a ligação dela o dia todo! Queria que me ligasse pedindo desculpas! Mas… mas ela nunca ligou!Num impulso, pegou o próprio celular e o abriu para provar sua versão.Mas, ao verificar a lixeira do histórico de chamadas…Os registros estavam ali.Vários números recusados.Todos feitos por mim.Naquele dia, o celular dela estava com Elisabete.Minha mãe ficou paralisada.Como se algo dentro dela tivesse morrido naquele instante.— Eu… eu só estava brava com ela! — Elisabete se desesperou, tentando se explicar. — Ela me empurrou na água, então eu não queria que mamãe atendesse! Mas… mas eu nunca desejei que
Ao descobrir o quão cruel e desesperadora foi minha morte, minha mãe desmoronou.Todos os dias, abraçava o lenço que mandei fazer para ela, afogada em lágrimas.Meu pai, embora igualmente devastado, tentava se manter firme.Cuidava da esposa, agora em um estado de torpor, e se esforçava para manter os frágeis pedaços daquela família destruída.Anita veio visitá-la.Pela primeira vez, minha mãe ouviu coisas que antes jamais teve paciência para escutar.— Você lembra quando Jesinha entrou na escola?A voz de Anita era suave, mas cada palavra abria uma ferida.— Ela participou de um concurso de desenho e queria fazer algo bonito para você. Todas as noites, depois da lição de casa, ficava horas desenhando. Não reclamava, não cansava. Quando ganhou o prêmio, correu para casa, animada, e te mostrou primeiro.Ela te amava tanto. Sempre pensava em você.A mãe não piscava, perdida num vazio sem fim.— Mas na parede da sua casa, só tinham os prêmios dos outros dois filhos. Não havia um único esp
Elisabete apertou as mãos com força, os dedos crispando no tecido da roupa.Mas nada podia impedir o policial de continuar:— O mais importante são algumas chamadas deletadas. O laudo forense confirmou que Jesiane foi enterrada viva. E essas ligações… foram seus pedidos de socorro. Mas você, ignorou todas elas.O rosto da minha mãe ficou completamente sem cor.— Não pode ser! Eu esperei a ligação dela o dia todo! Queria que me ligasse pedindo desculpas! Mas… mas ela nunca ligou!Num impulso, pegou o próprio celular e o abriu para provar sua versão.Mas, ao verificar a lixeira do histórico de chamadas…Os registros estavam ali.Vários números recusados.Todos feitos por mim.Naquele dia, o celular dela estava com Elisabete.Minha mãe ficou paralisada.Como se algo dentro dela tivesse morrido naquele instante.— Eu… eu só estava brava com ela! — Elisabete se desesperou, tentando se explicar. — Ela me empurrou na água, então eu não queria que mamãe atendesse! Mas… mas eu nunca desejei que
Sala de interrogatório.Minha mãe abraçava Elisabete protetoramente.— Eu sou a responsável legal dela. Qualquer coisa, perguntem para mim. Bete é só uma menina, não precisa passar por esse tipo de situação.Elisabete se encolhia em seus braços, o corpo tremendo levemente.Parecia realmente frágil, assustada, indefesa.O policial assistiu à cena e soltou um riso frio.— Menina? Ela tem vinte e seis anos!Minha mãe ignorou o tom de deboche e acariciou as costas de Elisabete, tentando acalmá-la.— Eu entendo que estão apenas fazendo o trabalho de vocês, mas Bete não sabe de nada. Ela e Jesiane eram irmãs, mas cada uma levava sua vida.O policial foi direto ao ponto:— Ontem, realizamos uma operação em um apartamento alugado onde um grupo estava envolvido em jogos ilegais. Durante a busca, encontramos alguns pertences de Jesiane. Foi Elisabete quem foi buscar os itens, certo?Minha mãe hesitou por um momento.— Sim… O celular e os documentos dela foram entregues a vocês agora há pouco. Ma
O aniversário de 60 anos da vovó foi uma celebração íntima, apenas para familiares e amigos próximos.No salão, minha mãe e meu pai varriam o local com os olhos, claramente à minha procura.Até Joel pareceu surpreso.— Jesiane não veio mesmo? Será que aconteceu alguma coisa com ela?Elisabete deu um tapa leve na mão dele.— Para de falar besteira! Ela já é adulta, não tem nada de errado.E só com isso, todos ficaram tranquilos novamente.Minha mãe suspirou.— Daqui a pouco, um monte de gente vai nos culpar por isso.Ao ouvir isso, não pude evitar um sorriso amargo.Então era isso.Achei que estivessem me esperando por preocupação…Mas, na verdade, era só medo da opinião alheia.Deixando esse assunto de lado, minha mãe se voltou para Elisabete.— Aproveite a ocasião e entregue seu presente para sua avó. Na frente de todo mundo, ela não vai te desmerecer.Os olhos de Elisabete brilharam de excitação.A vovó era uma empresária de grande prestígio na cidade, uma mulher rica e poderosa.Qua
Assim que atendeu a ligação, minha mãe disparou, irritada:— Sua desgraçada, será que pode parar de envenenar sua avó contra mim?!Mas a voz do outro lado era masculina. Soava séria.— Alô, a senhora é parente de Jesiane?Minha mãe franziu a testa.— Quem é você? E por que está com o celular dela? — O tom era frio.— Encontramos os documentos e o telefone de Jesiane em um apartamento alugado. Precisamos que compareça à delegacia para confirmar algumas informações.Ao ouvir isso, sua expressão relaxou um pouco.— Sabia que aquela praga tinha se mudado. Só sabe arrumar confusão.Sem demonstrar qualquer preocupação, desligou o telefone e continuou comendo.Elisabete desviou o olhar, inquieta.— Mamãe… não era a Jesiane?— Ela perdeu o celular. A delegacia só quer que alguém vá buscar. Nada urgente. Terminamos de comer primeiro.Elisabete esboçou uma expressão de ansiedade.Falou mais rápido do que o normal:— Mamãe, posso ir? Jesiane é minha irmã, afinal.Minha mãe elogiou sua "maturidade
No passado, a vovó não aprovou o casamento da minha mãe com meu pai, temendo que ela passasse dificuldades ao lado de um homem sem dinheiro.Revoltada, minha mãe passou a noite bebendo, sem imaginar que acabaria sendo violentada por um marginal e, pior ainda, engravidaria.Naquela época, ainda era jovem. Tinha opções melhores.Mas, para punir minha avó e fazê-la se sentir culpada, decidiu seguir com a gravidez.Quando completei três anos, um dia, ao olhar para mim, viu traços do meu pai no meu rosto e orreu para fazer um teste de DNA.O resultado confirmou: eu realmente era filha do meu pai, e não do agressor.Minha mãe ficou aliviada e, com isso, conseguiu reconquistar meu pai.Mas, para os dois, eu ainda era uma mancha na história de amor que eles tanto idealizavam.Sem pensar duas vezes, me deixaram com minha avó e partiram para longe, como se eu fosse um erro que precisavam esquecer.Naquela época, meu pai tinha acabado de se divorciar de sua primeira esposa.Joel já tinha dois ano
No dia seguinte, ainda não havia nenhuma notícia minha.De manhã cedo, minha avó apareceu.— Vovó!Feliz, flutuei em sua direção!Desde que morri, quis vê-la novamente, mas minha alma estava presa à minha mãe, incapaz de sair de perto dela.Mas agora, vovó estava aqui.Só de poder vê-la mais uma vez, já podia descansar em paz.Antes que eu pudesse me aproximar, Joel correu para abraçá-la, exclamando:— Vovó!Ao longo dos anos, ele sempre usou minha proximidade com ela para se aproximar também.Com o tempo, e com minha influência, vovó acabou aceitando esse “neto” sem laços de sangue.Ela não via motivos para tratá-lo com frieza.Segurou a mão de Joel com carinho e o fez sentar ao seu lado.— Já está tão grande e ainda faz esse escândalo? Onde está sua irmã?— Irmã! — Joel gritou.Na mesma hora, Elisabete correu até a sala.— Vovó! Que bom que a senhora veio!O olhar da vovó, que antes trazia uma ponta de expectativa, esfriou no mesmo instante.Respondeu apenas com um seco:— Ei.Sem um
O apresentador do noticiário alertava a população para evitar a área do Vale do Eclipse e prevenir mais tragédias.Joel se endireitou no sofá.— O Vale do Eclipse foi interditado?!A mãe franziu o cenho no mesmo instante, como se algo lhe ocorresse.Já Joel, ao contrário, saltou do sofá e bateu as mãos nas pernas, animado.— Isso é ótimo! Então a nossa viagem de acampamento foi a última antes do fechamento! Meus amigos vão morrer de inveja, nenhum deles teve essa chance!A tensão no rosto da mãe diminuiu um pouco.— Para de fazer esse escândalo. Já escolheu o presente da sua avó?O pai, que até então também estava sombrio, relaxou um pouco.— Esse ano, você e a Bete precisam se esforçar pra agradar a sua avó.Joel bufou, desinteressado.— Ah, relaxa. Todo ano a Jesiane escolhia o presente pra mim, e a vovó sempre gostava. Não precisa se preocupar.Dito isso, voltou sua atenção para o jogo na TV.Ao ouvir meu nome, a mãe lançou um olhar de puro desprezo e se levantou, indo para o quarto
— Como fui dar à luz uma criatura tão cruel e sem coração como você?! — A vovó estava tão indignada que mal conseguia respirar. — Passei dois meses fora do país sem nenhuma notícia dela! Fiquei preocupada todos os dias, e agora que voltei, ainda não consigo falar com ela! Com certeza foram vocês que fizeram ela sofrer!A voz dela tremeu de raiva.— Ela não mora com vocês? Manda ela atender o celular agora!A mãe ficou em silêncio por um instante e trocou um olhar com o pai.Dois meses atrás, Joel teve um capricho de acampar na área proibida do Vale do Eclipse.Eu sabia dos riscos, mas, no fundo, queria aproveitar essa oportunidade para me aproximar da família. Até tirei folga no trabalho para ir.Nunca imaginei que Elisabete cairia na água.E menos ainda, que ao ser resgatada, apontaria para mim e diria que eu a empurrei.A mãe não quis ouvir explicações. Completamente cega de raiva, me deu vários tapas no rosto e me abandonou na floresta.O que eles não sabiam... é que naquele dia, eu