Há alguns anos, Tia Júlia havia sido convencida pelo meu tio a sair da empresa e se dedicar apenas à família. Mas, com o tempo, a quantidade de parentes que ele colocou na empresa acabou transformando o ambiente em um completo caos. Tia Júlia, preocupada com a possibilidade de a empresa ser destruída por aqueles parasitas, lutou muito para retomar o controle, assumindo, finalmente, a gestão das finanças.Com ela no comando, os gastos foram cortados, e os aproveitadores começaram a perder suas mordomias. Naturalmente, começaram a falar mal dela para o meu tio, o que só piorou a relação entre os dois.Agora, pelo que parecia, ao tentar me ajudar, Tia Júlia havia desviado dinheiro da empresa, e meu tio descobriu. Mesmo que o problema já tivesse sido resolvido, ele com certeza usaria isso como munição para atacá-la. Era óbvio que ele aproveitaria a situação para colocá-la em desvantagem, talvez até exigir que ela saísse de casa sem nada ou assumisse dívidas.Ao perceber tudo isso, rapidame
— Cinquenta milhões? Não tenho. — Respondi friamente, vendo que ele tinha perdido completamente a noção.Embora a situação tivesse começado por minha causa, no fundo, a culpa era da própria família Borges. Acharem que eu bancaria a “trouxa” era simplesmente impossível.Arthur olhou ao redor do meu escritório, com uma expressão carregada de inveja:— Ouvi dizer que você está se divorciando do Davi e que ele te deixou a empresa. Também soube que você agora está ligada à poderosa família Auth. Aquele misterioso e discreto Sr. Jean desembolsou trezentos milhões para recuperar o Bracelete de Jade da minha tia, não foi?Ele se aproximou, parando bem na minha frente, com a cara de quem achava que tinha direito a tudo:— Pelo que parece, cinquenta milhões para você não é nada. Seja pedindo ao Davi ou ao Sr. Jean, é algo que você consegue com um estalar de dedos.Não consegui evitar um sorriso irônico. Então era por isso que ele estava aqui me pressionando. Ele tinha investigado tudo, achando q
Arthur ainda não tinha dito nada, mas Davi já estava impaciente e perguntou apressado:— Kiara, onde você vai arranjar cinquenta milhões? Você não tem tanto dinheiro assim.— E o que você tem a ver com isso? — Respondi, olhando para Davi e logo desmascarando seu joguinho. — Não está tentando usar o meu nome pra pegar dinheiro com ele e me fazer dever um favor, só pra depois me manipular? Pois não vou cair nessa.Davi ficou visivelmente constrangido e murmurou em defesa:— Você tá pensando errado. Só quero te ajudar, nada além disso.Arthur, por outro lado, se animou:— Então, cunhado, por que você não empresta agora?Eu interrompi Arthur com firmeza, apontando para a porta e com um olhar sério:— Se você aceitar dinheiro dele, os dois podem sair daqui agora. Não importa o que decidirem ou quanto ele te empreste, não tem nada a ver comigo.Arthur lançou um olhar esperançoso para Davi, mas ele permaneceu imóvel, sem reação. Soltei um sorriso de quem já sabia muito bem qual era a intenção
— Certo, você diz que temos algo, então temos, não é? Você pode trair, mas eu não posso? — Respondi no mesmo tom, jogando lenha na fogueira apenas para provocá-lo.Davi ficou sem palavras, claramente engasgado pela raiva. Seus olhos se arregalaram, e a respiração saiu em arfadas pesadas. Depois de um tempo, ele finalmente conseguiu falar, mas sua voz estava carregada de desprezo:— Não é à toa que você não quer voltar atrás. Não importa o quanto eu peça desculpas ou tente consertar as coisas, você continua irredutível… Agora entendo: você arranjou coisa melhor. Antes, quando a Clara falou isso, eu não acreditei. Mas agora vejo que estava certo. Kiara, você é uma decepção. Nunca imaginei que fosse tão interesseira e fútil!Que conveniente. Quando se quer culpar alguém, sempre se encontra uma desculpa.Soltei uma risada irônica, cheia de incredulidade, e devolvi sem hesitar:— Davi, você, um traidor da pior espécie, que virou as costas para o amor e a lealdade, não tem moral nenhuma para
— Não é pedir, é só um empréstimo temporário. O aluguel é de cinquenta milhões. É um valor generoso, você não sai perdendo. — Corrigiu Davi, tentando manter a calma.Eu o encarei por alguns segundos antes de soltar uma risada fria.O rosto dele se fechou imediatamente:— Por que está rindo?Com dificuldade, segurei o riso e, como se tivesse acabado de entender tudo, respondi:— Agora faz sentido. Achei que você tinha sido tão generoso ao oferecer aqueles cinquenta milhões ao Arthur e ainda colocar a dívida no meu nome. Mas, na verdade, era só um truque para me prender.Por sorte, eu não caí na armadilha. Caso contrário, agora estaria completamente nas suas mãos. Depois de dizer isso, voltei a rir, mas, por dentro, sentia um peso enorme no coração.Davi franziu a testa e falou com a voz baixa:— Kiara, você entendeu errado... Se cinquenta milhões não são suficientes, eu posso aumentar para trezentos milhões. Assim, você quita sua dívida com o Jean e corta qualquer ligação com ele.Eu ri
Será que ele ainda tem consciência? Ou será que a Clara conseguiu apagá-la por completo? A maldade humana parecia não ter limites, e a cada dia eu entendia isso de forma mais profunda.À noite, Bela me ligou para saber se eu já tinha conseguido me divorciar. Quando disse que não, ela ficou indignada, soltando uma enxurrada de xingamentos contra o Davi.Eu interrompi a fúria da minha melhor amiga, lembrando que tinha algo importante para discutir com ela:— Bela, deixa isso pra lá por enquanto. Preciso da sua ajuda com uma coisa.— Claro, o que você precisa?— Quero vender parte das ações da minha empresa. Você conhece muita gente, será que pode me ajudar a encontrar alguém interessado em investir?— Você está tentando levantar dinheiro pra ajudar a tia Júlia? — Bela sempre foi rápida para entender as coisas.— Isso mesmo. Não vou deixar a família Borges continuar humilhando ela. Se eu colocar esse dinheiro, a empresa tem que ficar no nome da tia Júlia. Ela vai ser a única responsável p
— Sim. Se não acredita, pode ir até a cozinha conferir. — Disse a Sra. Auth, com um sorriso leve.— Não, não, não é que eu não acredite, só acho que a senhora é boa demais comigo. Para ser honesta, fico até sem jeito. — Eu respondi, e não era exagero. Era exatamente assim que eu me sentia, desconfortavelmente grata.Eu realmente não conseguia entender. Por que uma família tão poderosa e influente como os Auth, e em especial alguém tão imponente como a Sra. Auth, seria tão gentil comigo? Mesmo que ela gostasse das roupas que eu fazia, com o status deles, poderiam contratar designers infinitamente melhores e mais renomados do que eu.— Não fique nervosa. Eu gosto de você, só isso.— Muito obrigada, Sra. Auth.A expressão “estou lisonjeada” nem começava a descrever o que eu sentia naquele momento.Quando a Sra. Auth foi trocar de roupa, aproveitei para pegar o celular e enviar uma mensagem para a Bela no WhatsApp:[O Lotus do Bom Sabor está de folga hoje, não está?]Ela respondeu na hora:
— Assim não é muito educado, não acha? — Hesitei, achando que seria falta de respeito.— Não se preocupe, aqui em casa os homens são todos viciados em trabalho. Nunca têm hora certa para voltar. Se eu fosse esperar por eles para cada refeição, já teria morrido de fome há tempos. — Respondeu a Sra. Auth, com bom humor, tentando me tranquilizar.Acabei rindo da leveza dela e segui para a sala de jantar. Os pratos, como esperado, eram obra do Lotus. Uma única mordida foi suficiente para eu reconhecer o toque do chef.— Se gostou, coma bastante. Dá para ver que anda trabalhando demais, você está até mais magra. — Comentou a Sra. Auth com um sorriso gentil.— Não é isso, senhora. Na verdade, eu sempre fui de comer bem. — Respondi, sentindo-me um pouco sem jeito.— Que ótimo. Quem tem apetite tem sorte. — Disse ela, com uma risada calorosa.Enquanto comíamos, conversamos sobre assuntos triviais. A atmosfera era agradável, mas, mesmo assim, eu não conseguia evitar ficar atenta aos sons ao red
Eu balancei a cabeça em concordância:— Isso é certo! Com seu sucesso e suas conquistas, com certeza os líderes da universidade vão te acompanhar pessoalmente.Ele sorriu, humilde:— Lidar com isso também é cansativo. Preferiria algo mais tranquilo.Eu não resisti e brinquei:— Esse é o tipo de problema que só os bem-sucedidos têm. Para nós, pessoas comuns, basta sentar entre os espectadores e aproveitar.Jean ficou visivelmente sem graça com o elogio. Ele abaixou a cabeça e sorriu de leve, mas logo mudou de assunto:— No dia da celebração, podemos ir juntos para a universidade.— O quê? Eu estava pensando em ir de metrô. Você vai mesmo comigo?Eu imaginei como seria o centenário da universidade: certamente um evento grandioso, com a área ao redor completamente congestionada. Sabendo disso, a escola provavelmente não permitiria a entrada de tantos carros, o que tornava o metrô a opção mais prática.Jean arqueou uma sobrancelha, com um leve tom de provocação.— Você vai toda arrumada e
O silêncio tomou conta do carro. Minhas mãos, que antes estavam segurando o casaco, caíram devagar. As abas abertas do casaco também se soltaram, deixando meu corpo mais exposto.Talvez por causa do assunto anterior, minha atenção ficou presa em algo que não deveria: o cinto de segurança que passava bem no meio do meu peito, fazendo com que ele parecesse ainda mais… evidente.Eu queria puxar o casaco e me cobrir novamente, mas não tinha coragem de fazer esse movimento. No meio desse silêncio desconfortável, arrisquei lançar um olhar de canto para Jean.Ele estava encostado na porta do carro, com o cotovelo apoiado na janela, segurando levemente o queixo com a mão. Conforme os postes de luz passavam, as sombras brincavam no rosto dele, criando um contraste que destacava ainda mais seus traços marcantes.Meus olhos pararam em seu pescoço, onde o pomo de Adão se movia levemente para cima e para baixo. Era um detalhe simples, mas que me pareceu incrivelmente atraente, quase hipnotizante. E
Por esse motivo, fui “recusada”. Disseram, de forma muito educada, que eu seria mais adequada como modelo de lingerie e sugeriram que eu considerasse essa possibilidade. Apesar de gostar de ganhar dinheiro, eu ainda tinha meu orgulho e não estava desesperada a ponto de usar meu corpo para subir na vida.Além disso, toda vez que eu fazia desfiles, sempre apareciam alguns homens inconvenientes me importunando. Quando Davi descobriu, ele foi categórico: proibiu-me de continuar.Hoje, tantos anos depois, ao pensar nisso, percebo como era bom ser jovem. Apesar de toda a correria, ainda havia entusiasmo e energia. Agora… mesmo sendo dona do meu próprio negócio, vivo tão exausta quanto um cachorro.Momentos como o de hoje, em que me reúno com amigos, saboreio boa comida, bom vinho e desfruto de uma leveza descontraída, tornaram-se um verdadeiro luxo.Enquanto eu refletia, perdida em memórias e nostalgia, Jean permaneceu cismado com o que eu havia dito. Ele franziu levemente a testa, visivelme
Mas eu sabia que Amélia não estava dormindo. Na verdade, ela provavelmente estava de ouvidos atentos, escutando tudo.Entre mim e Jean, o silêncio se instalou por algum tempo. A atmosfera na cabine do carro ficou cada vez mais tensa e desconfortável.Eu comecei a sentir calor. Não sabia se era porque estava nervosa demais ou se o vinho finalmente estava fazendo efeito. Depois de um bom tempo tentando me controlar, senti um leve suor se formando nas costas e não aguentei mais ficar calada:— Está ligado o ar-condicionado? Está um pouco quente…O motorista de Jean, um rapaz jovem que eu já tinha visto algumas vezes, respondeu rapidamente. Ele tinha a pele bronzeada, era alto, com uma postura impecável que denunciava seu passado provavelmente era um ex-militar, agora trabalhando como motorista e segurança.Ele olhou rapidamente pelo retrovisor, claramente surpreso com a pergunta, e respondeu:— Srta. Kiara, a temperatura está em 22°C.Era a temperatura mais confortável para o corpo humano
— Então você senta no meio. Daqui a pouco eu vou descer, é melhor ficar perto da porta. — Dei um giro rápido e empurrei Amélia para a minha frente.Mas Amélia, ágil como sempre, torceu o corpo e voltou para trás de mim:— Eu não vou sentar perto do meu irmão! Ele vai começar a me dar sermão! Prefiro ficar no canto, quietinha.O carro já estava parado na beira da rua havia alguns minutos, e nós continuávamos nesse vai e vem, empurrando e puxando. Era uma cena completamente desnecessária. Por fim, não tive escolha a não ser ceder. Subi no carro e me sentei no meio.O aroma de Jean imediatamente tomou conta do meu espaço. Era uma mistura fresca, intensa e ao mesmo tempo sofisticada. Sem perceber, engoli em seco. O lado do meu corpo que estava encostado nele parecia diferente, como se tivesse ganhado vida própria.— Bela, estamos indo. Obrigada por hoje à noite! — Amélia foi a última a entrar no carro e se despediu de Bela.— Tudo bem, tchau! — Bela acenou para nós enquanto o carro arranca
Nós três dividimos uma garrafa de vinho. Ninguém ficou bêbado, mas o clima estava descontraído e agradável. Quando o jantar já estava quase no fim, eu mandei uma mensagem para Jean pelo Line.Ele respondeu:[Chego em mais ou menos meia hora.]Fizemos as contas e, calculando o tempo, resolvemos nos levantar e sair quando imaginamos que ele já estaria próximo. Bela insistiu em nos acompanhar até a saída. Quando chegamos à porta do restaurante, o carro de Jean chegou exatamente naquele momento.Bela, parada ao meu lado, inclinou-se discretamente para cochichar:— Vai, confessa. Desde quando vocês dois estão juntos, hein?Fingi que não entendi:— Do que você está falando? Você deve estar bêbada.— Não se faça de desentendida!— Não tem nada disso! Você está confundindo as coisas... — Respondi, tentando parecer séria, e complementei. — Não se esqueça de que eu nem me divorciei ainda. Como seria possível? Além disso, mesmo que eu estivesse divorciada, sou uma mulher divorciada, com um pai qu
— Ah, eu não posso beber, mas vocês duas podem. — Amélia disse com um sorriso.— Como assim? Não tem graça se não forem as três juntas! — Eu estava de bom humor e não resisti a insistir. — Bebe só um pouquinho, não vai ter problema.— De jeito nenhum! Só se você pedir autorização ao meu irmão. — Amélia fez um biquinho e jogou a responsabilidade para cima de mim.Eu fiquei surpresa:— Eu? Falar com o seu irmão? Não seria melhor você mesma ligar e resolver isso?— Nem pensar! Se eu pedir, ele vai dizer não. — Amélia empurrou meu braço, fazendo um gesto manhoso. — Kiara, eu também quero beber um pouquinho... Vai, fala com ele por mim!— Isso... — Eu fiquei visivelmente desconfortável.Mas Bela, é claro, decidiu se juntar ao time de Amélia:— Liga para o Sr. Jean, fala que estamos no Bom Sabor. Não tem problema nenhum! Assim que terminarmos o jantar, eu mando alguém levar Amélia em casa com toda a segurança.Eu olhei para as duas com um rosto cheio de preocupação, mas Amélia já tinha pegad
Assim que terminei de falar, houve um instante de silêncio do outro lado da linha. Logo em seguida, ouvi a voz de tia Camila, cheia de empolgação e esperança:— Kiara, você está falando sério?— Claro que estou. Ficar com essas ações só me traz dor de cabeça. Todo mundo vem me importunar. Melhor vender logo, garantir o dinheiro no bolso e me livrar disso.Usei um tom levemente sarcástico, mas tia Camila ignorou completamente a provocação. Ela riu e foi direto ao ponto:— E por quanto você venderia para mim?Pensei por um momento antes de responder:— Eu já fiz as contas… Todas as minhas ações valem cerca de oitenta milhões. Mas, como você é da família, faço por sessenta milhões.— Sessenta milhões? Isso é muito dinheiro! Eu não tenho como levantar tudo isso de uma vez. Não dá para diminuir um pouco? Somos da mesma família, afinal… — Tia Camila começou a tentar barganhar, aproveitando-se da relação familiar.Eu, no entanto, conhecia bem as finanças da família. Eles tinham condições de c
Eu achava que, depois de Isabela passar vergonha na minha frente, o assunto estava encerrado. Mas não. Ela não aceitou o golpe e resolveu trazer reforços.No dia seguinte, um sábado, eu já tinha combinado um encontro com Bela e Amélia no restaurante Bom Sabor. Bela tinha insistido em nos convidar.Passei o dia trabalhando no estúdio e, ao fim da tarde, fui direto para o restaurante. Assim que cheguei e as vi, mal cumprimentei as duas, meu celular começou a tocar.Olhei para a tela: era tia Camila.— Bela, Amélia, conversem aí. Eu preciso atender.— Você não para um segundo, hein? — Bela comentou com um tom de brincadeira.Eu sorri, um pouco sem graça, e saí do reservado para atender a ligação:— Alô, tia Camila, tudo bem? Aconteceu alguma coisa?Do outro lado da linha, tia Camila respondeu com uma voz mansa e simpática:— Kiara, como você está? Tudo bem por aí?Assim que ouvi aquele tom, já percebi que vinha coisa. Sorri levemente e fui direta:— Tia Camila, estou no meio de um comprom