Eu tomei um puta susto e, no reflexo, dei uns passos pra trás.Pensei que ele estava fingindo estar bêbado pra aprontar alguma, mas, na real, a parada era ainda pior.— Amor… cheguei em casa… — Ele cambaleou e veio direto na minha direção.O cara era um armário. Se caísse em cima de mim, eu virava purê.Na mesma hora, desviei.Resultado?Tombo feio.O infeliz foi de cara no chão.A porrada foi tão forte que o chão tremeu.— Amor… — Ele levantou a cabeça, com uma cara de cachorro chutado.Sabe aquele bicho que corre todo feliz pro dono e leva um bico no meio da fuça?Pois é.Dava até dó.E talvez tenha sido por isso que um dia eu tenha me apaixonado por esse homem.Porque ele tinha essa cara de “me protege”, que me fazia querer perdoar tudo.Era o mesmo cara que uma vez soltou fogos na cidade inteira porque eu disse que gostava.Que ficou horas na fila só pra comprar um bonequinho pra mim.Que entrou num incêndio sem pensar duas vezes, só pra me salvar.Um amor desses é
— Valentina, já falei mil vezes! Eu e a Carina não temos nada! Você tá viajando! Para de usar esse papo de divórcio pra me pressionar! Pode insistir o quanto quiser, mas eu não vou mandar ela pra fora do país!Eu realmente achei que, dessa vez, ele tinha entendido que eu queria o divórcio.Mas, no final das contas, ele voltou com o mesmo papinho de sempre.Na cabeça dele, eu estava só surtando. Fazendo drama.A sensação de falar com uma parede estava me tirando do sério.Respirei fundo, tentando não mandar ele pra merda de vez, e encarei bem os olhos dele.— Enrico, presta atenção. Eu não tô fazendo cena. Não tô jogando o divórcio na sua cara pra conseguir alguma coisa. E, pelo amor de Deus, eu não tô nem aí pra onde você quer mandar essa mulher! — Eu só quero que vocês fiquem juntos e vivam felizes, bem longe de mim. — Aliás, se eu pudesse arrancar meu coração e enfiar na sua cara pra ver se você entende, eu faria!As mãos dele se fecharam com força.Os músculos do braço ficar
— Ah, não é nada, só um cortinho. — Enrico puxou a mão de volta, se afastando discretamente da Carina.Os olhos dela ficaram sombrios por um instante, mas foi tão rápido que quase passou despercebido. No segundo seguinte, lá estava ela de novo, com aquele sorrisinho doce e o olhar preocupado.— Enrico, pelo amor de Deus, vai cuidar dessa mão! Tá toda ferrada!— Não precisa. Primeiro eu te levo pra falar com o professor Rodrigo.Do outro lado do quarto, os pais da Valentina suspiraram pesadamente.Era isso.Se não fosse aquela confusão toda, se ele tivesse se divorciado antes, ele e a Carina já podiam estar juntos, felizes, sem precisar se esconder.Mas não.Tudo culpa da Valentina.E quanto mais pensavam nisso, mais ranço sentiam dela.A mãe da Valentina, de saco cheio, pegou o celular e ligou sem rodeios:— Joana, você sabia que o Enrico ainda não superou esse trauma, né? Por isso aceitou esse divórcio assim, tão fácil!Eu pisquei, confusa.— …???— Você é suja demais! E
A boate estava pegando fogo. Luzes piscando, música ensurdecedora, copos tilintando e risadas espalhadas por todo canto. O ar tinha aquele cheiro de álcool caro e de gente querendo se exibir.Rafael estava levando um cliente pro camarote pra fechar negócio quando, do nada, parou no meio do caminho. Mandou o assistente ir na frente e desviou, indo pro camarote ao lado.Depois de um papo furado qualquer, ele olhou direto pro Enrico e soltou:— E aí, Enrico… hoje não é o aniversário de 70 anos da vó da sua mulher?O cara nem piscou. Só pegou o copo na mesa e virou mais um gole de bebida.— Ainda tá puto com a sua esposa? — Rafael provocou, tentando arrancar alguma reação.— Mas, pô, ela também, né? Hoje era o dia de segurar as pontas, dar um jeito de acalmar você. Essa festa tem todo mundo da alta sociedade lá… e você não foi? Mano, tão rindo da cara dela até agora.Enrico abaixou os olhos, pegou o celular e desbloqueou.Nada.Nenhuma ligação. Nenhuma mensagem.O clima ao redor
Antes, eu me afundava cada vez mais na insegurança por causa do desprezo do Enrico. Mas, no fundo, o motivo real de eu nunca ter rebatido essas mulheres era outro: achava que brigar com outra mulher era perda de tempo.Só que, no final das contas, dar um passo pra trás nunca me trouxe paz. Só me trouxe mais humilhação.Cada sapo que eu engolia, me faziam engolir outro ainda maior.Então quer saber? Já que não adianta bancar a boazinha… que comece o barraco!As senhoras Leonor e Catarina eram amiguinhas inseparáveis da tia do Enrico. Assim que a mulher finalmente saiu do choque, armou pose de moralista e veio me dar sermão:— Valentina, que jeito é esse de falar comigo?!Olhei pra ela e sorri, calma, cruzando os braços.— Calma, tia. Já falo da senhora também.A mulher engoliu seco.— Mas já que a senhora tá tão preocupada com meu útero, me responde: se sou uma galinha velha que não bota ovo, então o Enrico é o quê? E minha tia, o que é você?O rosto dela caiu na hora.— E ma
O salão inteiro congelou.Diante de tanta gente, num evento desses, ser esculachada daquele jeito fez meus pais ficarem com a cara no chão.Afinal, eles sempre tentaram manter aquela pose de família perfeita na alta sociedade.Mas, claro, a queridinha deles, a intocável Carina, não podia deixar aquilo passar batido.E foi rápida no gatilho.Deu um passinho à frente, fez aquela carinha de anjo injustiçado e, com a voz trêmula e doce, soltou:— Vovó, por favor, não fica brava! Foi só um mal-entendido! — O Enrico… a perna…Antes que ela terminasse, Enrico, com a expressão fechada, completou:— Sim, vovó, a senhora entendeu errado. Só encontrei a Carina na entrada. Como ela estava com a perna machucada, eu a ajudei a entrar.Pausa dramática.E então, ele soltou a bomba:— E sabe por que ela tá machucada? Porque foi até a Igreja buscar um amuleto da sorte… pra senhora.O salão inteiro prendeu a respiração.E ele seguiu, com aquele tom sério, carregado de peso:— Dizem que o am
Eu sempre soube que tinha algo entre eles. Mas, ao mesmo tempo… eu amava demais o Enrico. Amava tanto que, mesmo sufocada por dúvidas, escolhia acreditar nele.Cada vez que ele dizia que não tinha nada com a Carina, eu me agarrava a isso como se fosse a última coisa que me restava.Me esforçava ao máximo para agradá-lo, me fazia de cega, fazia de tudo pra trazê-lo de volta.E toda vez que algo acontecia entre ele e a Carina, entrava em pânico, como um passarinho assustado, tremendo de medo de que, dessa vez, eu realmente o perdesse. E sempre que ele voltava, eu perguntava sem parar, feito uma louca:— Ainda me ama?E o pior?Tinha tanto medo de perder ele que, num momento de desespero, cheguei ao ponto de cortar meus pulsos… Achando que talvez isso fizesse ele olhar pra mim. Que ele largaria a Carina e voltaria para mim.Mas sabe de uma coisa?Nada disso funcionou.Pra mim, era dor. Era medo. Pra Enrico, era show. Piti. Então, em vez de voltar pra casa e sentir um míni
Ele falava com tanta seriedade que, por um instante, quase me fez cair nessa.Ele sabia direitinho como dar um golpe e logo depois fazer um agrado. Um verdadeiro mestre na arte de iludir e manipular. Não é à toa que a antiga eu vivia presa nessa ilusão.Mas, pro azar dele… já tá morto e enterrado.E se ele ainda achava que me tinha na palma da mão… azar o dele, porque não tem mais.O salão inteiro congelou.O silêncio estava estranho, pesado.Aquelas mesmas pessoas que, minutos atrás, achavam que estavam só dando uma “mãozinha” pro Enrico—ajudando ele a botar a esposa pra escanteio—agora pareciam… perdidas.No fim das contas, ele passou anos desprezando a própria mulher, colocando outra num pedestal, e agora queria bancar a vítima?Pior ainda: quer dar lição de moral e ameaçar todo mundo?Só podia ser piada.Dava pra ver pela cara de todo mundo que ninguém ali engoliu essa.Mas, se o pessoal ficou desconfortável, a minha querida “irmãzinha” ficou foi pálida de ódio.A expre
A expressão do Enrico, que antes trazia um traço de culpa, fechou na hora.— Valentina, para de fingir que não sabe.Eu… ???Saber o quê?!Se eu soubesse, por que diabos eu ia perguntar?!Será que esse cara não percebe o quanto eu quero ele longe?!Que, se eu puder, nem uma palavra a mais eu quero trocar com ele?!Segurei a vontade absurda de esganar ele na hora e fui direto ao ponto:— Olha, sei que não acredita, mas realmente esqueci algumas coisas depois do acidente.Ele riu.Riu na minha cara.— Ah, pronto. Agora tá com amnésia? — Que engraçado… Esqueceu só essa parte específica, né?Fechei os olhos, respirando fundo.Eu podia tentar explicar. Podia falar que só descobri toda essa história porque li meu próprio diário.Mas olhando pra cara dele…Pra quê?Ele não ia acreditar.Nunca acreditou em mim.Então, quer saber? Foda-se.— Tá bom. Digamos que eu aceite essa ideia absurda de que vocês dois não têm nada.Levantei o queixo, encarei ele sem piscar.— E daí?!
— Se o Enrico quiser me achar cruel, beleza. Mas se quiser se machucar, que faça isso sozinha. Não toca um dedo em mim.Minha voz saiu fria, cortante.— Se fizer isso de novo, se ousar me empurrar na água outra vez, eu jogo esse vídeo no ventilador. E aí, minha querida, nunca mais levanta.Eu queria que ela acelerasse esse divórcio. Mas de jeito nenhum eu ia aceitar ser um dano colateral no processo.Meu corpo está frágil demais agora. Não importava se era por esse casamento ou por qualquer outra coisa, não podia mais sofrer nenhum dano.Antes que a Carina, com aquela cara de quem estava mascando um limão, abrisse a boca, eu virei as costas e saí.Cheguei em casa, tomei um banho e, quando ia me jogar na cama…Dou de cara com o Enrico na minha sala.Minha testa franziu na hora.— Que diabos tá fazendo aqui?Eu tinha mudado a senha de novo. Como caralhos ele entrou?!Hackear leva tempo. E dessa vez, minha senha não tinha nada a ver com as antigas. Não tinha como ele adivinhar.
Carolina estava praticamente cuspindo fogo enquanto berrava:— Valentina, sua desgraçada! Você bateu a cabeça quando caiu, né?! — Ou será que o tombo foi tão forte que deixou seu coração preto de veneno?!Ela me apontava o dedo, tremendo de raiva.— Sabe muito bem que meu primo NUNCA vai ficar com a Carina! E ainda tem a cara de pau de sugerir isso?! — Como alguém pode ser tão maldosa quanto você?! — Como é que o destino pode ser tão injusto?! Aquele penhasco era tão alto, e mesmo assim, você não morreu?!Eu ……???Estava sendo boazinha! Estava dando minha bênção pros dois ficarem juntos! Olha só que generosa!E por que diabos o Enrico não pode ficar com a Carina? Não estavam quase se beijando naquela noite na suíte? A Carina não vive dizendo que ele é louco por ela? Se ele ama tanto assim, qual a desculpa pra ainda não estarem juntos? E se não rola entre eles, por que essa cobra insiste tanto em se enfiar no meu caminho com ele? E o MAIS IMPORTANTE DE TUDO…Se o Enrico
Enrico ainda parecia querer falar alguma coisa, mas, no último segundo, desistiu.A expressão dele ficou rígida, os lábios se abriram um pouco… mas logo se fecharam de novo.No fim, ele só me lançou aquele olhar.Aquele olhar de quem acha que sou uma criança birrenta que não sabe o que tá fazendo.Mas, ao mesmo tempo… um olhar cansado, resignado, como se pensasse: ‘Tudo bem, deixa ela se divertir com isso’.E saiu.Que nojo.Assim que a porta se fechou, Carina estendeu a mão.— Me deixa ver.Ah, então ela queria confirmar se eu tinha mesmo filmado?Pois bem.Abri o vídeo e mostrei pra ela, sem hesitação.Desde o momento em que ela chegou perto de mim na festa, até o segundo exato em que me empurrou na piscina, tudo estava gravado.Cada palavra. Cada sorriso falso. Cada movimento calculado.O rosto dela ficou pálido na hora.Os olhos se arregalaram, cheios de choque e ódio.Porque agora ela sabia.Se esse vídeo fosse divulgado… Meu pai e minha mãe veriam. O Enrico veria
O clima no quarto continuava carregado, cada um esperando o próximo movimento. Mas então, a porta se abriu de repente, e Carolina entrou como um furacão.Carina levantou os olhos para ela.Só um segundo.Mas foi o suficiente.Carolina entendeu tudo na hora.— Carina, fica tranquila! Já chamei a polícia! — anunciou, com um sorrisinho vitorioso. — Logo mais, essa desgraçada vai estar atrás das grades!O ambiente gelou.O rosto do Enrico ficou sério, e uma ruga de irritação surgiu em sua testa.— Carolina, que merda é essa?! Quem te mandou chamar a polícia?! — A voz dele saiu cortante, carregada de irritação.Ele fez uma pausa e seu olhar ficou ainda mais frio.— E outra coisa… se eu ouvir você xingando sua cunhada de novo, vai ter problema.Segurei o riso.Que cara mais sem noção.Me trata como se eu não valesse nada, mas quando outra pessoa me desrespeita, resolve bancar o marido protetor?Decide, né, bonitão?Mas Carolina não estava nem aí.— Agora você quer defender es
Agora, meu pai nem hesitou. Já foi metendo o pé na porta, ansioso para arrancar as ações para a Carina, como se aqueles 10% da JQ Pharma, que valiam mais de cem milhões, fossem apenas dez reais, fáceis de pegar.Mas em que momento exato eles acharam que podiam simplesmente enfiar a mão no meu dinheiro assim, do nada?Carina tentou manter a pose, mas vi seus dedos se apertarem com força no cobertor.Então era isso, né?Ontem, achei que ela tinha me empurrado na água só no calor do momento, por impulso. Mas agora… vejo que fui ingênua demais.Ela já tinha tudo planejado.Se eu não tivesse ido até a piscina, ela ia dar um jeito de me levar até lá.Se não fosse a piscina, seria qualquer outra coisa.O importante era que, no final, tinha que parecer que eu queria matar ela.Assim, ela matava quatro coelhos com uma cajadada só: 1. Me forçava a me humilhar, pedindo desculpas. 2. Facilitava ainda mais a obtenção das ações. 3. Me fazia desistir completamente do Enrico. 4. Fazia o E
Fiz minha melhor cara de inocente.— Ué, só tô elogiando a aparência da minha irmãzinha.Cruzei os braços e inclinei levemente a cabeça.— Agora nem elogiar pode mais?Meus pais já estavam vermelhos de raiva.— Joana, desde quando ficou assim?!Minha mãe me olhava como se eu fosse a pior pessoa do mundo.— Sua irmã sempre foi tão boa com você! Até agora, ela estava pedindo pra gente não chamar a polícia! Disse que foi só um momento de impulso seu e pediu pra gente te perdoar!Ela bufou, a voz tremendo de indignação.— E o que faz? Em vez de reconhecer, ainda tem a audácia de zombar dela?! — Não tem um pingo de compaixão?! Por que sempre persegue a Carina?!Minha mãe bateu a colher na mesa com força, os olhos faiscando, como se estivesse prestes a me bater.— Primeiro, causou o sequestro da sua irmã e nem se deu ao trabalho de pedir desculpa! Depois, a fez querer morrer e a deixou no hospital! — Na festa da sua avó, humilhou sua irmã na frente de todo mundo! E como se não bas
Tentei puxar meu braço, mas ele segurava com tanta força que me machucava. Eu não me atrevia a forçar, então apenas o encarei, minha voz saindo fria e cortante:— Solta. Não vou pedir desculpa.Enrico franziu a testa, impaciente.— Não vai pedir desculpa? Então quer ir pra cadeia?Ele sempre achou que eu tinha caído na piscina por acidente. Só quando Carolina começou a berrar sobre chamar a polícia que ele finalmente percebeu que estavam me acusando de empurrar Carina.— Tem ideia do que fez? Quase matou a Carina!Respirou fundo, como se estivesse tentando manter a calma, e continuou:— Já disse, na frente de todo mundo, que minha esposa sempre será você. Que entre mim e a Carina nunca teve nada. Então por que insiste nisso? Por que teve que jogá-la na água?Os olhos dele se estreitaram, como se realmente não entendesse.— Valentina, será que dá pra ser um pouco menos cruel? Dá pra ter um mínimo de compaixão pela Carina?E pronto.Lá estava.Mais uma vez, exatamente como eu
— Valentina, sua vadia! Como você ousa aparecer aqui?! — A mulher berrou, os olhos cheios de ódio, e veio para cima de mim com fúria.Tentei dar um passo para trás, mas antes que conseguisse me esquivar, um corpo alto surgiu na minha frente, bloqueando o ataque e levando a porrada no meu lugar.O impacto fez Renato franzir a testa. Meu olhar se tornou gélido na mesma hora.A mulher, ao perceber que não tinha me acertado, ficou ainda mais furiosa. Ela apertou os punhos, tremendo de raiva, e apontou um dedo acusador para Renato.— Quem é você?! Por que tá defendendo essa vagabunda?! O quê… é o amante dela?!E, como se tivesse acabado de desvendar o maior escândalo do século, continuou, sarcástica:— Agora tudo faz sentido! É por isso que tá se achando, né, Valentina? Encontrou um otário pra bancar você e já se sente a dona do mundo! — Vou contar para meu primo! Quero ver se ele ainda vai deixar você sair desse casamento sem um centavo sequer!Ah… a gloriosa Carolina, filha da tia