No meio da noite. Um grupo de pessoas estava reunido jogando cartas e bebendo. Anselmo olhou para as cartas que tinha recebido mais uma vez e viu que era outra mão horrível. Ele franziu ligeiramente a testa, pegou a caixinha de cigarros ao lado e acendeu um cigarro. Rômulo lhe lançou um olhar e riu: — Não tinha dito que ia parar de fumar? Por que está fumando de novo? Anselmo ainda não tinha respondido, quando alguém fez uma piada: — Pois é, Anselmo, você não falou que ia parar? Com esse cheiro de cigarro no corpo, quando voltar para casa, não tem medo de a Marília não deixar você entrar? — Se você não falar, ninguém vai achar que você é mudo! — O tom brusco e repentino de Anselmo pegou todos de surpresa. Rômulo deu um chute leve na pessoa que tinha feito a piada e falou de maneira significativa: — O Anselmo agora tem namorada. Se a Srta. Esperança ouvir isso, ela não vai gostar. Não diga essas coisas mais no futuro! Eles tinham crescido juntos e sempre tiveram uma
Depois que o último paciente da manhã saiu, Leandro tirou o jaleco, lavou as mãos e pegou o celular para fazer uma ligação:— Estou saindo agora.Do outro lado da linha, o barulho era intenso, e Diógenes, com sua voz alta, respondeu:— Leandro, eu já estou no refeitório com o Gaeliano e os outros. Sua sobrinha está lá fora te esperando faz um bom tempo. A garota raramente aparece por aqui, leve ela para comer algo bom fora!Leandro caminhava em direção à porta enquanto segurava o celular. Quando pôs a mão na maçaneta, parou de repente, franzindo a testa:— Minha sobrinha?— Sim! A que vimos no bar anteontem, lembra? A garota bonita. Ela não te chamou de tio? — Diógenes, entre pedidos para que os outros parassem de empurrar, continuou. — Eu até pensei em entrar para te avisar, mas ela não quis, disse que não queria atrapalhar o seu trabalho. Está lá fora esperando, toda educada! Não vou falar mais nada, é minha vez de pegar comida. Vai logo levar sua sobrinha para almoçar fora. A essa h
O homem carregava nos olhos uma impaciência e frieza que não fazia questão de esconder. Marília sustentou o olhar dele, mas sem muita firmeza. Estava claro para ela que ele queria cortar qualquer vínculo, desejando ao máximo se distanciar dela, temendo que ela o importunasse. Se Marília tivesse um pouco de orgulho, teria desistido naquele momento. Porém, ao lembrar que no ano passado Anselmo e Esperança tinham se envolvido pelas suas costas, sentiu uma raiva difícil de conter. Leandro não era apenas o homem que Esperança havia admirado em vão por quatro anos. Ele era superior a Anselmo em todos os aspectos. Os amigos falsos de Anselmo sempre diziam que ela nunca encontraria alguém melhor. Só para provar o contrário, Marília precisava conquistar Leandro. — Vamos trocar nossos contatos! — Disse ela. Marília pegou o celular, mas Leandro permaneceu imóvel, olhando para ela com frieza. Tentando improvisar, ela rapidamente continuou: — Você comprou roupas para mim. Posso tr
— Você se lembra de como respondeu à minha pergunta ontem? Claro que ela se lembrava do que havia dito no dia anterior. Só que Marília não esperava que fosse se arrepender tão rápido. Se ela tivesse aceitado de imediato, não estaria passando por esse constrangimento agora! — O que eu disse ontem foi para que você não se sentisse obrigado a ficar comigo por pura responsabilidade! Marília enfatizou a palavra "obrigado" enquanto apertava a bolsa sobre os joelhos, visivelmente nervosa, mas mantendo um sorriso doce no rosto. Leandro a observava em silêncio. Depois de alguns segundos, ele abriu os lábios, falando num tom frio: — Então você não quer que eu me sinta responsável por você? Marília sabia que, se respondesse negativamente, ele certamente usaria isso como desculpa para rejeitar de vez sua investida. Ela ajeitou os cabelos e disse com suavidade e clareza: — Eu fiquei sabendo que você não tem namorada, e eu também estou solteira. Podemos tentar? — Não é necess
Entrando no refeitório, Marília percebeu que havia poucas pessoas por lá, com muitos lugares vazios. Diógenes, sempre prestativo, acompanhou Marília até a área de distribuição de comida. O serviço era self-service: pratos com carne ou vegetais tinham o mesmo preço, calculado pelo peso. No entanto, a maioria dos pratos com carne já havia acabado. Restavam mais opções vegetarianas, e o frango assado, que Diógenes tanto elogiara, também já tinha se esgotado. O que sobrara eram pequenos pedaços de carne e alguns ossos de frango. Marília se serviu de alguns legumes e, entre eles, conseguiu pegar um pedaço de carne bovina. Diógenes passou o cartão para pagar a refeição dela. Uma mesa acomodava quatro pessoas, e Diógenes se sentou ao lado de Leandro. Marília se sentou de frente para Diógenes, com um assento vazio ao seu lado. Naquele lugar vazio, já havia uma bandeja de comida pronta. — Onde a Dra. Serafina está? — Perguntou Marília. Diógenes apontou com o queixo: — Ali! M
Na vitrine de Marília, a maioria dos itens eram pequenos acessórios na faixa de algumas centenas a dois mil reais. Esses itens, por terem um preço acessível, podiam ser vendidos diretamente pelos colegas assim que os clientes escolhiam um modelo. Já peças como uma pulseira de esmeralda, que ultrapassavam os dez mil reais, os colegas não ousavam vender sem a presença dela. O mercado de pulseiras de esmeralda era uma área complicada, mas altamente lucrativa. Uma pulseira com boa coloração e qualidade podia ter uma diferença de preço de milhares ou até dezenas de milhares de reais, dependendo de quem estivesse vendendo e do poder de negociação do comprador. Marília não tinha muito capital para investir. Ela comprava mercadorias na faixa de poucos milhares a dezenas de milhares de reais. Com a revenda, conseguia lucrar entre dois e três mil reais por peça, e, em situações favoráveis, até quatro ou cinco mil reais, um lucro maior do que o que ganhava desenhando suas próprias peças.
Depois de jantar com os colegas, Marília pegou um táxi para voltar para casa. O carro parou no meio do trânsito quando o semáforo fechou no cruzamento. Marília pegou o celular para olhar as horas, quando ele começou a vibrar. Era uma ligação. Ao ver o nome "Rômulo", Marília hesitou. Não queria atender. Mas, se lembrando do que Selma dissera mais cedo, acabou clicando em "atender". Sua voz soou fria: — Qual é o assunto? — Você precisa vir para o Espaço Palmeiras! — Marília estava prestes a recusar, mas Rômulo continuou do outro lado com urgência. — A Zélia acabou de me ligar, perguntando onde o Anselmo está. Eu passei o endereço para ela, e ela deve chegar a qualquer momento. Estou com medo de que ela faça alguma confusão! — Já estou indo! Nesse momento, o semáforo abriu, e Marília pediu ao motorista que virasse ali mesmo, no cruzamento. ... Ainda bem que o Espaço Palmeiras não ficava longe. Cerca de dez minutos depois, o táxi parou em frente à entrada do clube. O Es
Diógenes respondeu rapidamente a Marília, dizendo que Leandro tinha comido toda a comida que ela enviara, sem deixar nada. Marília ficou surpresa, pois achava que Leandro jogaria tudo no lixo. Diógenes logo mandou outra mensagem: [Essa foi a primeira vez que vi o Leandro comendo tão bem. Mimi, de qual restaurante você pediu a comida? Amanhã vou encomendar para experimentar também!] Marília, que até então não tinha muita confiança em conquistar Leandro, sentiu um pouco de esperança ao ver o que Diógenes havia dito. [Fui eu que fiz.] Do outro lado, veio uma reação surpresa: [Você sabe cozinhar?!] Marília respondeu com um emoji de orgulho. A digitação do outro lado parou por um momento. Marília ficou olhando para a janela de bate-papo. Depois de um bom tempo, Diógenes mandou outra mensagem: [Como o Leandro pode deixar você, sobrinha dele, cozinhar para ele? Isso não é abuso?] Marília não mencionou que estava tentando conquistar Leandro e inventou uma desculpa qualquer: [Ele
Marília finalmente entendeu por que a geladeira estava tão cheia: Leandro tinha contratado uma senhora para cozinhar. Ela viu a mulher empacotar os alimentos que ainda estavam bons para levar embora. — Vai jogar isso fora? — O Dr. Leandro tem problemas no estômago, ele não pode comer comida de um dia para o outro. Marília tinha acabado de preparar o jantar com comida do dia anterior. Afinal, os ingredientes comprados no mercado ou supermercado nem sempre eram frescos do mesmo dia. Para ela, aquilo era um enorme desperdício. — Senhora, que tal deixar essas comidas para mim? Eu levo amanhã! A senhora hesitou e olhou para Leandro. — Tem mais na geladeira, pode levar. — Certo. — A senhora imediatamente pegou os sacos e se preparou para sair. Antes de atravessar a porta, se voltou com um sorriso. — É a primeira vez que vejo o senhor trazer uma moça para casa. Sua namorada é muito bonita! Marília estava acostumada a ouvir elogios sobre sua beleza, mas a senhora tinha acabad
O céu começava a escurecer, e todos corriam para voltar para casa. Sempre que o ônibus parava na estação, uma multidão se amontoava para entrar, enquanto os rostos na plataforma mudavam constantemente, um após o outro. No final, só restou ela. Marília não sabia para onde ir. Um Maybach preto parou ao lado da estação de ônibus. A janela se abaixou, revelando o rosto familiar e elegante de um homem. — Entre. Marília ficou paralisada por um momento, mas logo se recompôs, respondendo: — Ah. — Pegou sua bolsa, se levantou e entrou no banco do passageiro da frente. Leandro dirigiu o carro para longe da estação. Observando a direção em que ele seguia, Marília disse apressadamente: — Você pode parar em um hotel, não precisa me levar muito longe. — E acrescentou logo em seguida. — Não precisa ser um hotel cinco estrelas, pode ser uma daquelas redes econômicas. Algo em torno de duzentos ou trezentos reais por noite já está bom. Leandro parou o carro em um cruzamento e se viro
— Se você acha que esse filho biológico não vale tanto quanto uma filha adotiva para vocês, então eu também posso sair de casa! Anselmo se virou e começou a sair. Madalena tremia de raiva: — Anselmo, você vai se arrepender! Anselmo parou por um instante, mas logo saiu em passos largos. ... Marília voltou para a loja com o café. O ambiente parecia um pouco estranho, e ela perguntou, sem entender: — O que aconteceu? — O chefe passou aqui para inspecionar a loja. Marília assentiu. Zélia havia dito que viria à loja para encontrá-la hoje. — E onde ela está agora? — Já foi embora. Os colegas dividiram o café. Um deles tomou um gole e continuou: — A chefe estava de mau humor hoje, deu uma baita bronca. A Dalva saiu chorando. — Eu não chorei! — Seus olhos estavam vermelhos! Outro colega também confirmou com um aceno a cabeça, ainda com uma expressão apreensiva: — Quando a chefe está brava, é assustador. Eu nem tive coragem de abrir a boca. Será que ela está
Marília ouviu aquelas palavras e sentiu os olhos se encherem de lágrimas. Ela queria estar com Anselmo, principalmente porque desejava fazer parte daquela família. Afinal, a tia e o tio sempre a trataram como uma filha. — Mimi, a tia não vai mais se meter nos assuntos entre você e o Anselmo, mas você precisa voltar para casa. Os tempos estão perigosos, e eu não fico tranquila com você, uma menina, morando fora! — Tia, eu estou morando com a Zélia agora. Não se preocupe comigo, estou muito bem! — Zélia? — Madalena sabia que a melhor amiga de Mimi era a garota da família Barbosa. — Ela está morando fora de casa? — Sim, a Zélia comprou uma casa, e agora moramos juntas. Estamos muito felizes juntas. Madalena sabia que a família Barbosa era rica e que Zélia, filha única, tratada como uma joia preciosa. Se Mimi estava morando com ela, provavelmente não haveria problema. Mesmo assim, Madalena suspirou: — Mas você não está aqui, e eu sinto sua falta! Que tal se eu mandar o An
— Que besteira é essa que você está falando? Madalena não podia acreditar no que o filho dizia. Ela conhecia bem o temperamento de Mimi, melhor do que qualquer outra pessoa. Toda vez que aquela menina estava perto de seu filho, o brilho de felicidade e carinho nos olhos de Mimi era algo que ela simplesmente não conseguia esconder. — Mãe, se você não acredita no que o seu próprio filho está dizendo, pode perguntar a ela! Todos os olhares na sala se voltaram para Marília. Embora Marília não quisesse decepcionar a tia, também não queria se envolver novamente com um homem como Anselmo. — Tia, eu já tenho namorado. Madalena ficou visivelmente chocada. — Mimi, você não estava se dando tão bem com o Anselmo? Ela e o marido haviam viajado por apenas duas semanas, e agora as coisas entre os dois jovens tinnham mudado tanto assim? — Eu e o Anselmo... Eu sempre o vi como um irmão. Nunca tivemos esse tipo de sentimento. O olhar de Anselmo ficou sombrio enquanto ele encarava o
Marília estava na loja ajudando os clientes a experimentarem vestidos de festa quando recebeu uma ligação de sua tia. Avisou a uma colega e rapidamente pegou um táxi de volta para a casa da família Pereira. Tainá a esperava do lado de fora e, assim que a viu, disse: — Sua tia e seu tio voltaram de viagem. Quando souberam que você se mudou, ficaram furiosos. Agora o Sr. Anselmo foi chamado de volta para casa para ser repreendido. — Tainá tentou convencê-la. — Srta. Marília, por que não volta para casa? Sua tia sente muito a sua falta. Ela até trouxe presentes para você da viagem. Assim que chegou, perguntou por você e nem se lembrou de perguntar pelo Sr. Anselmo. Para ela, você é como uma filha. No coração dela, você é mais importante que o próprio Anselmo... Tainá tagarelava sem parar, mas Marília permaneceu em silêncio. Quando chegaram à porta, ouviram uma voz masculina, cheia de raiva, ecoando lá dentro: — Você quer trazer essa atrizinha para dentro da nossa casa? Só por cima
Marília ficou paralisada. Leandro percebeu que ela não dizia nada e achou que suas palavras talvez tivessem sido um pouco inadequadas. Então, rapidamente, ele mudou o tom: — Se Sente um pouco, vou chamar a Eloá para a levar para casa! — Ah... Não precisa, seria muito incômodo. Eu posso passar a noite aqui mesmo. Leandro já estava com o celular na mão. Ao ouvir isso, ele levantou os olhos para ela. Marília ficou um pouco desconcertada e, apressada, cobriu a boca com a mão, fingindo um bocejo: — É que... Estou com sono. Onde fica o quarto de hóspedes? Quero descansar. — É o segundo quarto ali. — Está bem. — Marília estava prestes a ir para o quarto de hóspedes, mas, ao dar dois passos, se lembrou de algo e voltou, um pouco sem graça. — Não trouxe roupa para trocar. Leandro se levantou e foi até o quarto buscar uma camisa para ela. Quando Marília viu que ele havia trazido uma camisa dele, seu rosto imediatamente ficou quente. A luz brilhante da sala iluminava seu ros
O porteiro da guarita ligou do condomínio, e Leandro confirmou. Pouco depois, a campainha tocou. De chinelos, ele foi atender à porta. Assim que a abriu, deu de cara com uma mulher. Leandro franziu as sobrancelhas: — O que você está fazendo aqui? Marília levantou os itens que segurava nas mãos: — Não foi você que me mandou mensagem no WhatsApp pedindo para eu comprar remédios? Leandro olhou para as caixas de remédio dentro da sacola plástica, que estava molhada pela chuva. As gotas de água ainda escorriam dela. As roupas de Marília também estavam encharcadas. A parte de cima estava mais seca, mas as calças estavam completamente molhadas até a altura das canelas, e os sapatos também estavam encharcados. No lugar onde ela estava de pé, já havia uma pequena poça de água. Marília percebeu que o homem a encarava. Era evidente que ele não estava contente com a presença dela. Apesar da sensação de desconforto que crescia em seu peito, ela se lembrou de que ele a havia ajudad
— Eu sei! O Rômulo gosta é daquele tipo de mulher mais madura e cheia de charme, daquelas que sabem dominar na cama. A Marília é muito conservadora, o Rômulo não se sente à vontade com ela! Assim que essas palavras foram ditas, todos caíram na gargalhada. Rômulo deu um chute no cara que falou isso, xingou, e, quando as risadas diminuíram, se virou para Teodoro e tentou aconselhá-lo: — A Marília já tem namorado agora, então é melhor você não se meter. Vai que o namorado dela é alguém que não é fácil de lidar, e, aí quem vai se dar mal é você. — Em toda Serenópolis, quem é realmente importante não está praticamente todo mundo aqui? Não tem muitas famílias que podem se comparar com a família Silva. Teodoro teria medo do namorado misterioso da Marília? A menos que você, Rômulo, esteja interessado na Marília, porque, se não for o caso, eu garanto que o Teodoro vai conquistar a garota. Quanto ao namorado dela, eu resolvo isso! Vendo que tinha chegado a esse ponto e ainda assim os o